Prémio Sakharov para a Liberdade de Pensamento
O Prémio Sakharov recompensa personalidades excepcionais que lutam contra a intolerância, o fanatismo e a opressão. A exemplo de Andrei Sakharov, os laureados com o Prémio Sakharov testemunham a coragem que é necessária para defender os direitos do Homem e a liberdade de expressão.
0. Laureados
Nelson Rolihlahla Mandela - 1988, África do Sul
Seis anos após ter sido agraciado com o primeiro Prémio Sakharov, Nelson Mandela foi eleito, nas primeiras eleições livres do país, primeiro Presidente e Chefe de Estado negro da República da África do Sul.
Mandela passara 27 anos da sua vida atrás das grades sob o regime racial do apartheid, tornando se o símbolo da resistência contra o racismo. No momento da entrega do Prémio Sakharov, em 1988, continuava sob prisão domiciliária, e só quatro meses após a sua libertação, em Junho de 1990, é que se dirigiu ao Parlamento Europeu.
Mandela era inflexível na necessidade de uma solução justa e duradoura para transformar a África do Sul num «país unido, democrático e não racista». Menos do que isso seria «um insulto à memória dos inúmeros patriotas da África do Sul e do resto da nossa região que sacrificaram as suas próprias vidas para nos levar ao ponto em que, hoje, podemos dizer, com confiança, que o fim do regime de apartheid está próximo».
Ao despedir se do Parlamento sul-africano - 10 anos após ter tomado posse como
Presidente - Mandela salientou que «os inimigos históricos conseguiram negociar
a transição pacífica do apartheid para a democracia, justamente porque nos
dispusemos a aceitar a capacidade intrínseca de bondade que existe nos outros».
Nelson Mandela, que foi igualmente distinguido com o Prémio Nobel da Paz em
1993, retirou se da vida pública, mas continua a defender os seus ideais
através das suas organizações de beneficência, a Fundação Nelson Mandela e o
Fundo Nelson Mandela para as Crianças.
Em Junho de 2013, aos 94 anos de idade, Mandela foi hospitalizado com uma grave
infecção nos pulmões, originalmente contraída durante o seu encarceramento.
Milhares de pessoas de todo o mundo enviaram mensagens de carinho e apoio.
Como o próprio Mandela afirmou em tempos, «o que conta na vida não é o simples
facto de termos vivido, mas sim a diferença que fizemos na vida dos outros»
Nelson Mandela morreu a 5de Dezembro de 2013 na sua casa em Joanesburgo, com 95
anos de idade.
Anatoli Marchenko (a título póstumo) - 1988, Rússia
Anatoli Marchenko, um dos mais conhecidos dissidentes da ex União Soviética, faleceu em 1986 na prisão de Tchistopol, em consequência de uma greve de fome que se prolongou durante três meses em defesa da libertação de todos os prisioneiros de consciência soviéticos. Marchenko tinha apenas 48 anos de idade, mas passou mais de 20 anos encarcerado e em exílio interno. Os protestos internacionais que se seguiram à sua morte foram um fator preponderante para pressionar Mikhail Gorbachev, então Secretário Geral do Partido Comunista, a finalmente autorizar a libertação em grande escala dos prisioneiros políticos em 1987.
Marchenko tornou se mundialmente famoso através de um livro autobiográfico
sobre os campos de trabalhos forçados e as prisões soviéticas no seu tempo,
intitulado «O meu testemunho». Tendo abandonado a escola aos oito anos de
idade, Marchenko autoeducou se durante o seu período de encarceramento. Após a
sua libertação em 1966, não só escreveu a referida obra inspiradora, mas também
aderiu ao movimento soviético de defesa dos direitos humanos, tornando se, em
1975, um dos membros fundadores do influente Grupo Moscovo Helsínquia,
organizando protestos e apelos e escrevendo um grande número de cartas abertas,
muitas das quais o levaram à prisão por diversas ocasiões.
Em 1988, aquando da entrega do Prémio Sakharov à viúva de Marchenko, Larissa
Bogoraz, o próprio Andrei Sakharov prestou homenagem a Anatoli Marchenko,
afirmando, numa mensagem dirigida ao PE, que: «Em O meu Testemunho, Marchenko
foi o primeiro a contar a verdade sobre os campos de trabalhos forçados e
prisões na era pós Estaline. A sua obra tornou se uma das pedras basilares do
movimento de defesa dos direitos do homem no nosso país. Com o seu espírito de
moralidade através da luta pacífica pela justiça e com a sua ambição de verdade
nua e crua, o livro despertou o ódio dos órgãos de repressão relativamente ao
seu autor. Os restantes anos da sua vida e a sua morte trágica na prisão de
Tchistopol foram a forma que encontraram para fazer Marchenko pagar pela
verdade, firmeza e pelo seu elevado princípio moral. Os feitos da vida e obra
de Marchenko constituem um enorme contributo para a causa da democracia, da
humanidade e da justiça».
Alexander Dubček - 1989, Eslováquia
Alexander
Dubček (1921 1992) foi um dos catalisadores do processo de renovação e
mudança no antigo bloco comunista e a figura de proa do movimento de reforma
que ficou conhecido como a Primavera de Praga em 1968, na Checoslováquia.
Dubček cresceu no seio de uma família empenhada na construção do
socialismo na União Soviética. Em 1939, Dubček filiou se secretamente ao
Partido Comunista e, após a ocupação da Checoslováquia na Segunda Guerra
Mundial, aderiu igualmente à resistência clandestina contra o Estado eslovaco
pró-alemão.
Em 1968, quando Dubček, um comunista confesso, se tornou o novo Primeiro
Secretário do Partido Comunista da Checoslováquia, procurou liberalizar o
regime comunista.
Deu início a um conjunto de reformas liberais, conferindo à imprensa uma maior
liberdade de expressão, reabilitando as vítimas das purgas políticas da era de
Estaline e introduzindo um programa de reforma que previa reformas económicas e
uma ampla democratização da vida política da Checoslováquia. As suas reformas
suscitaram preocupações em Moscovo e os seus esforços no sentido de dar ao
Socialismo um «rosto humano» foram aniquilados, em 21 de agosto de 1968, pelos
tanques do Pacto de Varsóvia, que entraram na Checoslováquia e assumiram o
controlo da cidade de Praga. Dubček foi raptado pelo KGB e levado para o
Kremlin, tendo ficado detido por um breve período de tempo.
Em 1970, foi acusado de traição, demitido de todas as funções e expulso do
Partido Comunista checo. Durante 15 anos ganhou a vida como operário e só
voltou à vida política ativa em 1988, atuando no movimento de defesa dos
direitos cívicos.
Depois da revolução de 1989 na Checoslováquia, Dubček foi eleito
Presidente da Assembleia Nacional de 1989 a 1992. Como símbolo de esperança
para os dissidentes soviéticos nos seus longos anos de luta pela Glasnost -
assim o referiu Andrei Sakharov numa mensagem proferida por ocasião da
cerimónia de entrega do Prémio Sakharov - Dubček exprimiu o desejo de que
«através da Primavera de Praga ressoe, em 1990 e em todos os anos futuros, a
grande sinfonia do espírito comunitário europeu».
Dubček
morreu em 1992, vítima de um acidente de viação.
Aung San Suu Kyi - 1990, Mianmar/Birmânia
A liderança de Aung San Suu Kyi na luta pela democracia na Birmânia/Mianmar foi reconhecida com a atribuição do Prémio Sakharov em 1990. Um ano mais tarde, Aung San Suu Kyi foi igualmente laureada com o Prémio Nobel da Paz.
Filha de Aung San, um herói nacional da Birmânia independente que foi assassinado quando ela apenas tinha dois anos de idade, e de Khin Kyi, uma conceituada diplomata birmanesa, San Suu Kyi regressou ao seu país em 1988, após ter vivido longos anos no estrangeiro, para cuidar da mãe, que se encontrava gravemente doente. Foi nesta altura que presenciou os violentos massacres dos manifestantes que protestavam contra o regime militar de U Ne Win, o que a levou a dar início à sua luta pacífica pela defesa da democracia e dos direitos humanos.
Aung San Suu Kyi passou grande parte das duas décadas que se seguiram ao ano de 1990 detida ou em prisão domiciliária, depois de a junta militar no governo na Birmânia ter reprimido a sua Liga Nacional para a Democracia com detenções e ações sangrentas, recusando abrir mão do poder, não obstante a esmagadora vitória da Liga nas eleições desse mesmo ano. Enquanto se encontrava em prisão domiciliária, as autoridades recusaram se a emitir um visto ao marido, a quem fora diagnosticado um cancro, para a visitar em Mianmar, instando a, em vez disso, a abandonar o país. Prevendo que não lhe seria permitido regressar ao seu país, recusou esta situação e não voltou a ver o seu marido até à sua morte em 1999.
Em 2010, encontrava-se ainda em prisão domiciliária quando foram realizadas as primeiras eleições de Mianmar em duas décadas, acabando por ser libertada seis dias mais tarde. Enquanto o país encetava reformas democráticas, Aung San Suu Kyi concorreu às eleições legislativas intercalares em abril de 2012, nas quais o seu partido conquistou 43 dos 45 lugares em disputa. Atualmente, lidera a oposição parlamentar.
Na sequência da sua vitória eleitoral, o PE, que apelara em diversas ocasiões à sua libertação incondicional, aplaudiu a como «um exemplo da coragem abnegada e da luta pela liberdade e pela democracia face à tirania».
Em 2013, Aung San Suu Kyi manifestou o seu desejo de concorrer à presidência do seu país.
Adem Demaçi - 1991, Kosovo
Nascido em Priština, no Kosovo, em 1936, o escritor Adem Demaçi passou grande parte da sua vida, entre 1958 e 1990, na prisão por ter lutado pela defesa dos direitos fundamentais dos albaneses do Kosovo e ter denunciado a cruel opressão de dois milhões de albaneses no Kosovo pela Sérvia.
«Nos nossos dias, podemos confirmar que a liberdade de expressão é o primeiro passo indispensável para a democracia. Sem liberdade de expressão não há diálogo, sem diálogo não se pode descobrir a verdade e sem a verdade o progresso é impossível».
Após a sua libertação, Demaçi assumiu a direção do Conselho da Defesa dos Direitos do Homem e das Liberdades. Em 1996, ingressou numa carreira política ao filiar se no Partido Parlamentar do Kosovo, tendo se tornado o seu Presidente. Demaçi foi um dos mentores dos protestos abertos contra o regime sérvio, afirmando que não-violência não significa necessariamente passividade e dando, assim, início a uma campanha de protesto visível, mas não violenta, contra o domínio sérvio. Esta campanha consistiu em instar os kosovares a apagarem as suas luzes durante cinco minutos e a manterem se parados na rua durante um minuto, de forma completamente sincronizada.
Entre 1998 e 1999, durante a guerra no Kosovo, foi o representante político do Exército de Libertação do Kosovo (UCK) e permaneceu no Kosovo enquanto outros líderes abandonaram o país.
Após a guerra, consagrou se principalmente à reconciliação étnica e ao regresso dos refugiados. Assumiu a presidência do Comité para a Compreensão Mútua, a Tolerância e a Coexistência, que reúne representantes de todos os grupos étnicos do Kosovo, «porque o Kosovo pertence a todos» e «porque queremos uma sociedade livre, democrática e multiétnica».
Em 1996, Adem Demaçi foi nomeado para o Prémio Nobel da Paz. Demaçi escreveu vários livros, tais como «Amor Quantificável» e «Mãe Shega e as suas cinco filhas». A sua trilogia intitulada «Cinzas 99» representa a imagem espiritual do drama albanês, o seu próprio drama.
Las Madres de Plaza de Mayo - 1992, Argentina
Durante muitos anos, as «Mães da Praça de Maio» (Las Madres de La Plaza de Mayo) mantiveram se unidas na luta e na dor de quem nunca encontrou os seus filhos perdidos. Este movimento, que surgiu da procura levada a cabo pelas mães das crianças «desaparecidas» durante a «Guerra Suja» na Argentina (1976-1983), contribuiu para derrubar o regime militar do país e para julgar e encarcerar alguns dos responsáveis por crimes contra a Humanidade.
Ser uma «Mãe da Praça de Maio» significava enfrentar o medo e suportar ameaças, violência e detenções arbitrárias, num país onde se esperava que as mulheres sofressem as injustiças em silêncio. Estas mães usaram os seus corpos como «cartazes ambulantes» das fotografias e dos nomes dos seus filhos desaparecidos, exigindo que os mesmos fossem devolvidos. Numa época em que as pessoas não podiam sequer reunir-se, as Mães realizaram o seu primeiro protesto empreendendo uma marcha lenta em círculo, no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio, na «Plaza de Mayo». Apenas 14 mulheres deram início a este protesto, mas, mais tarde, juntaram se-lhes centenas de outras mulheres e a sua resistência passiva manteve as unidas, mesmo quando algumas delas iam «desaparecendo».
Graças às transformações democráticas operadas na Argentina em 2006, as Mães realizaram a sua última Marcha de Resistência anual, declarando que «o inimigo já não se encontrava na Casa do Governo». O movimento acabou por se desagregar, devido a desentendimentos internos. A linha fundadora continuou, no entanto, as suas marchas semanais, às quintas feiras, a fim de comemorar a longa luta travada, à qual se juntou um novo grupo, «Os Filhos dos Desaparecidos» (Los Hijos des los Desaparecidos).
Por ocasião do 36.º aniversário, Hebe de Bonafini, líder do movimento, exortou, numa carta aberta, o Supremo Tribunal de Justiça da Argentina a «refletir sobre a sua própria imagem e a, de vez em quando, defender o povo argentino e não apenas as grandes empresas».
O movimento das «Mães da Praça de Maio», que começou por ser uma mera procura pessoal dos filhos raptados, evoluiu, transformando-se numa luta política por uma justiça independente.
Oslobodjenje - 1993, Bósnia-Herzegovina
Durante a guerra na antiga Jugoslávia, o jornal diário mais popular Oslobodjenje (Libertação) empregava trabalhadores bósnios, sérvios e croatas da Bósnia. Apesar da ocorrência de mortos e feridos entre os jornalistas e da destruição da casa editorial por artilheiros sérvios, cerca de 70 redatores continuaram a trabalhar para publicar o jornal, correndo risco de vida, num refúgio instalado na cave da editora, em Saraievo.
Segundo um dos seus antigos redatores, Zlatko Disdarević, que viria a ser mais tarde embaixador da Bósnia, o objetivo do Oslobodjenje consistia em conservar e defender a Bósnia Herzegovina como Estado multiétnico: «Os nossos esforços visam impedir a morte, a divisão ou mesmo o desaparecimento da Bósnia Herzegovina do mapa. A população de Saraievo e da Bósnia Herzegovina continuará a lutar contra a divisão gerada pela Europa que existia antes da Grande Guerra».
Os editores do Oslobođenje foram designados Editores Internacionais do Ano de 1993 pela World Press Review, que os distinguiu pela sua «coragem, perseverança e dedicação aos princípios do jornalismo». Em virtude do seu extraordinário trabalho e dos esforços envidados, os jornalistas do Oslobodjenje foram agraciados com muitos outros prémios: o Jornal do Ano em 1992, o Prémio da Liberdade em 1993, o Prémio Oscar Romero em 1993, o Prémio Louis M. Lyons atribuído pela Nieman Foundation em 1993, reconhecendo a consciência e a integridade no jornalismo, e o Prémio Achievements in Journalism em 1993. Em 1995, o redator chefe, Mehmed Halilovic, aceitou receber a Medalha de Honra da Universidade de Missouri, da School of Journalism in Columbia (Escola de Jornalismo de Columbia), pela publicação contínua do jornal diário durante o cerco a Saraievo entre 1992 e 1995.
O Oslobodjenje foi fundado em 1943 e continua a estar sediado em Saraievo. Em 2006, o jornal foi adquirido por duas grandes empresas da cidade, a Fábrica de Tabaco de Saraievo e a Indústria Cervejeira de Saraievo.
Taslima Nasreen - 1994, Bangladeche
Nascida no Bangladeche em 1962, Taslima Nasreen começou a escrever aos 13 anos de idade, sendo conhecida pela sua escrita enérgica sobre a opressão de que as mulheres são vítimas e pelas firmes críticas que tece à religião, não obstante ter sido forçada ao exílio e às inúmeras «fatwas» (julgamentos religiosos) que reclamam a sua morte. Tendo sido galardoada com vários prémios, as suas obras foram traduzidas para 30 línguas.
Taslima Nasreen é igualmente médica, humanista laica e ativista dos direitos humanos, e afirma convictamente a sua identidade bengali. Porém, devido aos seus pensamentos e ideias, alguns dos seus livros foram proibidos no Bangladeche e a própria foi igualmente banida de Bengala, tanto do Bangladeche como do Estado indiano de Bengala Ocidental.
Em 1994, quando ganhou o Prémio Sakharov, já havia procurado refúgio na Europa, onde residia exilada em França e na Suécia. No seu discurso de agradecimento pela atribuição do prémio, Taslima Nasreen afirmou que vem de uma parte do mundo em que as tensões sociais e as dificuldades humanas são avassaladoras: como escritora, entende não poder fechar os olhos perante a fome e a dor quotidianas.
Alguns anos mais tarde, em setembro de 1998, Taslima Nasreen regressou ao Bangladeche para visitar a mãe, que se encontrava gravemente doente. Mal a notícia se espalhou, os fundamentalistas religiosos reclamaram, uma vez mais, a morte da escritora. Um tribunal emitiu um mandado de prisão e ameaçou confiscar os seus bens. O PE respondeu ao pedido de ajuda de Taslima Nasreen e exortou, numa resolução, o Governo do Bangladeche a proteger a vida e a garantir a segurança da escritora. Devido às constantes ameaças, Taslima Nasreen foi obrigada a deixar o seu país em janeiro de 1999. Atualmente, vive em Nova Deli.
Numa visita que efetuou ao Parlamento Europeu em junho de 2013, Taslima Nasreen insistiu em que fosse concedido apoio aos movimentos laicos no Bangladeche, a fim de contrariar a escalada do fundamentalismo islâmico, sustentando que este último põe particularmente em causa os direitos das mulheres. Taslima Nasreen insurge se contra o fundamentalismo em todas as religiões.
Leyla Zana - 1995, Turquia
Em 1991, Leyla Zana foi a primeira mulher curda a conquistar um assento no Parlamento turco. Devido ao seu ativismo político, também ela esteve presa durante dez anos, tendo sido condenada pelos tribunais turcos por atentado contra a unidade do país.
Aos 15 anos de idade, casou se com o antigo presidente do município de Diyarbakir, Mehdi Zana, que foi preso durante o regime militar na década de 1980, acusado de «separatismo». Tendo iniciado os estudos aos 23 anos de idade, obteve os diplomas do ensino primário e secundário em apenas três anos, acabando por desempenhar um papel de liderança não pretendido à medida que o seu desenvolvimento pessoal começou a ser considerado praticamente um sinónimo da concretização dos direitos fundamentais da população curda. Eleita para o Parlamento por esmagadora maioria, Leyla Zana provocou um escândalo na cerimónia de tomada de posse quando pronunciou em curdo as seguintes palavras: «presto juramento em nome da fraternidade entre os povos turco e curdo.» Na altura, falar em língua curda na cena pública era considerado um crime.
Em 1994, foi lhe retirada a imunidade parlamentar e condenada a 15 anos de prisão por «traição e filiação ao Partido armado dos Trabalhadores do Curdistão (PKK)», uma acusação por si negada.
O PE atribuiu lhe o Prémio Sakharov em 1995 pela sua corajosa defesa dos direitos humanos e pelo seu empenhamento numa solução pacífica e democrática para os conflitos entre o Governo turco e a população curda.
Em 2004, após o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem ter determinado que Leyla Zana não tivera um julgamento justo e independente, esta pôde, finalmente, usar da palavra perante o plenário do PE na sua cerimónia de entrega do Prémio Sakharov.
Em 2012, foi novamente condenada a uma pena de prisão de dez anos por «difusão de propaganda terrorista», mas, na qualidade de deputada do Parlamento turco, reeleita em 2011, goza de imunidade parlamentar até ao próximo escrutínio, agendado para 2015.
Em junho de 2012, Leyla Zana reuniu se com o Primeiro Ministro Erdoğan, após ter afirmado publicamente que esperava que ele resolvesse a questão curda. A sua iniciativa serviu de base para o processo de negociação, graças ao qual o líder do PKK, Abdullah Öcalan, em março de 2013, fez a sua exortação histórica ao PKK para passar da resistência armada à luta política democrática.
Wei Jingsheng - 1996, China
O «Pai do movimento democrático chinês» vive no exílio, mas continua a ser um líder ativo da oposição à ditadura comunista da China.
É o autor da obra «The Courage to Stand Alone: letters from Prison and Other Writings» (A coragem de ficar sozinho: cartas escritas na prisão e outros escritos), artigos que inicialmente escrevera em papel higiénico na prisão e que se encontram agora publicados em mais de 12 línguas.
Foi condenado a duas penas de prisão, de 29 anos no total, 18 anos dos quais pelas suas atividades e obras em prol da democracia, nomeadamente o seu ensaio inovador de 1978 intitulado «The Fifth Modernization: Democracy» (A quinta modernização: democracia). Tudo começou com um mural assinado no «Muro da Democracia» em Pequim, no qual os trabalhadores, artistas e intelectuais exerciam o seu direito à liberdade de expressão. Esse mural causou sensação, não só porque atacava abertamente a «ditadura democrática do povo» dos comunistas, mas também porque ousou assiná lo tanto com o seu verdadeiro nome como com os seus dados de contacto.
Na revista clandestina Exploração, fundada e editada por Wei Jingsheng, este escreveu o artigo «Democracia ou uma nova ditadura?», identificando o então líder comunista Deng Xiaoping como o novo ditador. Três dias mais tarde, foi detido e acusado de levar a cabo uma «contrarrevolução», sendo condenado a uma pena de 15 anos de prisão em 1979. Wei Jingsheng passou pelo corredor da morte, em seguida foi colocado em regime de isolamento e esteve detido, sob uma apertada vigilância, em campos de trabalhos forçados até 1993, altura em que foi libertado devido à decisão da China de se candidatar aos Jogos Olímpicos de 2000. No espaço de seis meses, foi detido pela segunda vez, julgado e acusado novamente de levar a cabo atividades contrarrevolucionárias e condenado a mais 14 anos de prisão.
No momento da entrega do seu Prémio Sakharov em 1996, Wei Jingsheng continuava preso. Em 1997, após uma forte pressão internacional, Wei foi libertado da prisão e deportado para os Estados Unidos. Ele afirma que não foi libertado, mas que o seu exílio é mais uma punição.
Em Washington, dirige a Fundação Wei Jinsheng, a Coligação Chinesa Ultramarina para a Democracia e a Aliança Democrática Asiática.
Salima Ghezali - 1997, Argélia
Salima Ghezali é uma jornalista, escritora e ativista dos direitos das mulheres argelina. Nos anos 80, começou a participar no movimento feminista argelino, nomeadamente como uma das fundadoras de «Mulheres da Europa e do Magrebe» e como chefe de redação da revista feminina por ela fundada, NYSSA.
Tendo passado de professora a jornalista, em 1994 começou a editar o semanário argelino redigido em francês, «La Nation» (A Nação), o mais lido na Argélia. Durante a guerra civil iniciada em 1991 entre o governo e os grupos rebeldes e que assolou o país durante 11 anos, o «La Nation» preconizou o diálogo político entre todas as partes envolvidas no conflito, defendeu os direitos humanos e a liberdade de expressão para todos e teceu críticas tanto ao governo como aos grupos islâmicos, sendo o único jornal a tomar esta atitude. Por esta razão, o jornal foi confiscado e suspendido diversas vezes, acabando por ser proibido em 1996, após Ghezali ter publicado no jornal «Le Monde Diplomatique» um artigo sobre a situação dos direitos humanos na Argélia.
A publicação do «La Nation» foi retomada em 2011 na Internet. Numa carta do editor, Ghezali explicou as razões subjacentes à sua decisão: «Não podemos ficar indiferentes à dinâmica dos jovens do mundo árabe que lutam pela sua dignidade e liberdade. Não podemos ficar indiferentes ao que se passa no nosso país. Queremos que o povo argelino seja feliz, porque o merece. Queremos instituições sólidas, melhores recursos humanos numa verdadeira democracia e a consolidação do Estado de direito». Finalizou a carta com o desejo de «uma melhor Argélia, onde a boa governação seja a regra».
Salima Ghezali foi galardoada com uma série de prémios de direitos humanos, tais como o World Press Review Award, o Olof Palm Priee e o Rothko Chapel Oscar Romero Award, e prossegue as suas atividades em prol dos direitos das mulheres, dos direitos humanos e da democracia na Argélia.
Ibrahim Rugova - 1998, Kosovo
Em 1998, quando se verifica a escalada do conflito armado entre as unidades sérvias e o Exército de Libertação do Kosovo, o Parlamento Europeu homenageou um homem, que defendeu, de forma consequente, o princípio da resistência pacífica à violência.
Ao receber o prémio, Ibrahim Rugova afirmou que esse prémio representava para si e para todo o povo do Kosovo o reconhecimento de uma luta pacífica e dos seus sacrifícios.
Nascido em 2 de dezembro de 1944, em Cerrca (Istog), no Kosovo, Rugova dava aulas de literatura na Universidade de Priština, antes de, em 1989, ter sido eleito presidente da Liga Democrática do Kosovo (LDK). Nesse mesmo ano, o regime de Belgrado aboliu o estatuto de autonomia da província do Kosovo e reprimiu os albaneses, encarcerando os líderes da oposição. Em 1990, os 2 milhões de albaneses do Kosovo adotaram a sua própria Constituição. Num referendo realizado em 1991, 97 % pronunciaram se a favor da independência do Kosovo e, em 1998, Rugova foi reeleito Presidente da autoproclamada República do Kosovo.
Rugova empenhou se numa oposição pacífica ao regime sérvio, reiterando constantemente a sua disponibilidade para encetar um diálogo com Belgrado. A sua posição nas negociações recebeu críticas por parte de Adem Demaçi, que favorecia uma abordagem mais nacionalista.
Simultaneamente, tentou chamar a atenção do mundo para a causa do seu povo, instando repetidamente a comunidade internacional a intensificar a sua pressão e a oferecer proteção internacional ao Kosovo. Convencido de que a autodeterminação de um povo apenas se poderá processar num clima de paz, Rugova assinou, na qualidade de responsável pelas negociações em nome dos albaneses do Kosovo, o Acordo de Paz de Rambouillet, em 18 de março de 1999.
A recusa de Belgrado em assinar esse acordo teve como consequência os ataques da NATO à Jugoslávia, em 24 de março, e a retirada das forças jugoslavas do Kosovo. Rugova foi obrigado a passar à clandestinidade. Em março de 2002, Ibrahim Rugova foi eleito primeiro Presidente do Kosovo. Viria a falecer de cancro em 21 de janeiro de 2006.
Xanana Gusmão - 1999, Timor-Leste
Xanana Gusmão é conhecido como o «Mandela timorense». Reconhecido como líder e símbolo da resistência timorense que teve por objetivo pôr cobro ao conflito armado em prol da independência em relação à Indonésia, tinha acabado de ser libertado da prisão onde havia cumprido sete anos de uma pena de 20 anos sob a acusação de separatismo, quando o PE o galardoou com o Prémio Sakharov em dezembro de 1999.
Com a retirada dos portugueses de Timor Leste, a Indonésia deu início a uma política de desestabilização das relações com o país vizinho. Em 7 de dezembro de 1975, a Indonésia invadiu Timor-Leste. Xanana Gusmão passou à clandestinidade, tendo assumido em 1978 a liderança do braço armado da Frente Revolucionária para a Independência de Timor Leste (FRETILIN).
Segundo as estimativas, a violência que acompanhou a invasão causou a morte a 200 000 pessoas, mas a oposição popular sobreviveu lhe. Xanana Gusmão empreendeu diversas tentativas para conseguir a resolução pacífica do conflito. Assim, propôs ao Governo indonésio um plano de paz e conversações sob a égide das Nações Unidas. Em 1986, conseguiu reunir as forças políticas e sociais de Timor Leste no Conselho Nacional da Resistência Timorense (CNRT).
No entanto, em 20 de novembro de 1992, Xanana Gusmão foi detido e condenado, primeiramente, a prisão perpétua e, mais tarde, a 20 anos de prisão. Todavia, a resistência timorense manteve se e foram exercidas enormes pressões internacionais sobre a Indonésia em prol da sua libertação. Com a sua libertação em setembro de 1999, pouco tempo depois do referendo de 30 de agosto, em que 80 % da população de Timor Leste se pronunciou a favor da independência, Xanana Gusmão prometeu «fazer tudo o que estiver ao meu alcance para trazer a paz a Timor Leste e ao meu povo».
Em abril de 2002, nas primeiras eleições presidenciais livres realizadas em Timor Leste, Xanana Gusmão foi eleito com cerca de 83 % dos votos. Em 20 de maio de 2002, Kofi Annan, Secretário Geral das Nações Unidas, declarou oficialmente a independência da República Democrática de Timor Leste, tendo Xanana Gusmão desempenhado as funções de Presidente até maio de 2007. Em 2008, sobreviveu a uma tentativa de assassinato. Atualmente, ocupa o cargo de Primeiro Ministro.
¡BASTA YA! - 2000, Espanha
Os membros da iniciativa ¡Basta Ya! arriscaram as suas vidas na luta contra o terrorismo. A sua única «arma» era a mobilização pacífica dos cidadãos em defesa das liberdades fundamentais. Durante muitos anos, as liberdades fundamentais e os direitos humanos estiveram em perigo no País Basco, devido ao terrorismo da ETA e grupos afins. Milhares de pessoas foram vítimas de campanhas de intimidação, extorsão, chantagem, ataques ou atentados mortais dirigidos contra si, as suas famílias ou os seus bens. Não tinham a possibilidade de se exprimir livremente, nem de exercer os seus direitos sem correr grandes riscos.
A iniciativa ¡Basta Ya! foi criada porque as liberdades civis fundamentais e os direitos humanos estavam sob ameaça no País Basco, nomeadamente no que dizia respeito aos cidadãos «não nacionalistas», devido ao terrorismo da ETA e grupos afins. A sua criação deveu se igualmente ao aumento do nacionalismo étnico e xenófobo entre os partidos mais moderados e aos grupos que procuravam chegar a acordo com a ETA.
A iniciativa cidadã ¡BASTA YA! (designação que significa «BASTA!»), associação com estatuto de órgão consultivo no Conselho Económico e Social das Nações Unidas, concedido em julho de 2004, consistia num coletivo de cidadãos que defendiam os direitos humanos fundamentais, a democracia e a tolerância no País Basco.
A organização levou a cabo várias atividades, entre as quais se destacam as duas grandes manifestações realizadas em San Sebastian, em fevereiro e outubro de 2000, onde se exigiu a dissolução da ETA, o apoio às vítimas do terrorismo e a defesa da Constituição e do Estatuto de Autonomia do País Basco como base para uma coexistência digna de todos os cidadãos bascos.
A iniciativa ¡BASTA YA! dissolveu se em 2007. Os seus dirigentes, Carlos Martinez Gorriarán, Juan Luis Fabo, Rosa Díez e Fernando Savater, criaram um partido político (UPyD), que está atualmente ativo na cena política espanhola. Fernando Savater foi o líder intelectual do movimento, pelo que representou a iniciativa ¡BASTA YA! na cerimónia de entrega do Prémio Sakharov que teve lugar em 2000 no Parlamento Europeu.
Dom Zacarias Kamwenho - 2001, Angola
Em 1999, começou a despontar no povo angolano uma nova consciencialização da necessidade de lutar pela paz e pelos direitos humanos, encorajada pelos esforços dos líderes religiosos e por diversas organizações da sociedade civil, no sentido de promover uma «reconciliação nacional inclusiva». À cabeça desses esforços de paz encontrava se Dom Zacarias Kamuenho.
Nascido em Chimbundo (Huambo, Angola) em 1934, foi ordenado padre em 1961 e tornou-se Arcebispo de Lubango em 1995. A sua voz firme, imparcial e persistente fez se repetidamente ouvir junto de todas as partes do conflito, perseguindo o objetivo de uma paz duradoura pela via do diálogo político, após 26 anos de guerra civil. Pelos seus incansáveis esforços em prol da paz, o Parlamento Europeu atribuiu lhe, em 2001, o Prémio Sakharov.
O cessar fogo de 2002, que se seguiu ao assassinato do líder da guerrilha Jonas Savimbi, as conversações de paz e o clima geral favorável à democratização ficam a dever se à campanha dirigida por Dom Zacarias Kamuenho e outros destacados representantes da sociedade religiosa e civil. Em 2003, Dom Zacarias Kamuenho renunciou à presidência da Conferência Episcopal de Angola e de São Tomé, mas continuou ativo, através da sua diocese e do Comité Intereclesial para a Paz em Angola, em prol da implementação da democracia, do respeito pelas liberdades fundamentais e pelos direitos humanos, da instauração do Estado de direito e de uma reconciliação nacional duradoura.
Em 2007, declarou que «em especial nos dois últimos anos, tem vindo a despontar no povo angolano uma nova consciencialização da necessidade de lutar pela paz e pelos direitos humanos, encorajada e representada pelos esforços dos líderes religiosos e por diversas organizações da sociedade civil, que perseguem o objetivo fundamental da "reconciliação nacional"».
Em 2012, o arcebispo, já aposentado, apelou aos angolanos para que exercessem o seu direito de voto.
Nurit Peled-Elhanan - 2001, Israel
A israelita Nurit Peled Elhanan, nascida em 1949, é professora universitária e escritora. A filha, Smadar, de 13 anos, foi vítima de um atentado suicida, cometido em Jerusalém Ocidental por um palestiniano, em 1997.
«Só por ser israelita, a minha menina foi morta por um jovem oprimido e exasperado ao ponto de se suicidar e de cometer um assassínio, só porque era palestiniano. Ambos foram vítimas da ocupação israelita da Palestina. Agora, o sangue de ambos mistura se nas pedras de Jerusalém, que sempre foram indiferentes ao derramar de sangue». Nurit Peled não permitiu a presença das autoridades israelitas, incluindo o próprio Primeiro Ministro, nas cerimónias fúnebres.
Filha do célebre General Matti Peled, conhecido pela sua campanha em prol da paz e do progresso, Nurit Peled tornou se um símbolo de todos os que, em Israel, lutam contra a ocupação e pela liberdade da Palestina.
Está igualmente muito empenhada em mudar a mentalidade da sociedade israelita, sobretudo da geração mais jovem. Na sua mais recente publicação, intitulada «Palestine in Israeli school books. Ideology and propaganda in education» (A Palestina nos livros escolares em Israel. Ideologia e propaganda na educação), chama a atenção para uma educação praticada nas escolas israelitas que parece raiar mais o racismo do que a tolerância e a diversidade. Nurit Peled tem criticado severamente os líderes mundiais, incluindo George Bush, Tony Blair e Ariel Sharon, pelo facto de «incutirem nos respetivos cidadãos um medo cego dos muçulmanos».
Nurit Peled Elhanan é cofundadora do Tribunal Russell, um Tribunal Popular Internacional instituído em 2009 para analisar o papel e a cumplicidade de terceiros, como governos, instituições e grandes empresas, nas violações do direito internacional perpetradas por Israel contra o povo palestiniano.
Izzat Ghazzawi - 2001, Palestina
Izzat Ghazzawi (1952 2003) foi um docente e escritor palestiniano, cujas obras incidiram nos problemas e sofrimentos infligidos pela ocupação israelita ao território palestiniano e no seu próprio sofrimento, que considerava ser possível transformar em poder de cura.
A sua vida foi marcada pelo assassinato, pelo exército israelita, do seu filho de 16 anos de idade, Ramy, em 1993. Ramy foi morto no pátio da escola quando tentava socorrer um colega ferido. Não obstante estas trágicas circunstâncias, Izzat Ghazzawi não cessou a procura do diálogo cultural e político com o povo israelita.
Nascido de uma família de refugiados, fez um Mestrado em Literatura Inglesa e Americana e trabalhou como docente na Universidade de Birzeit. Foi presidente da Associação de Escritores Palestinianos, autor de romances e contos, crítico literário e organizou e presidiu a primeira Conferência Internacional de Escritores na Palestina (1997).
Izzat Ghazzawi fez igualmente parte do órgão executivo do Conselho Palestiniano para a Justiça e a Paz, tendo lhe sido atribuído, em 1995, o Prémio Internacional para a Liberdade de Expressão, em Stavanger. Foi várias vezes detido e perseguido pelas autoridades israelitas, devido às suas atividades políticas.
Na cerimónia de entrega do Prémio Sakharov em 2001, a então Presidente do Parlamento Europeu, Nicole Fontaine, prestou-lhe homenagem pelo facto de ser «incansável na sua procura de paz, encorajando sempre o diálogo entre os povos israelita e palestiniano. Incansável, apesar da prisão, apesar da censura e, sobretudo, apesar da perda irreparável de Ramy, seu filho de 16 anos».
Logo após a morte do filho, juntamente com o escritor israelita Abraham B. Yehoshua e o fotógrafo Oliviero Toscani, Izzat Ghazzawi publicou o livro «Enemies» (Inimigos) sobre as relações entre palestinianos e israelitas, que conheceu grande êxito.
Izzat Ghazzawi faleceu em 4 de abril de 2003.
Oswaldo José Payá Sardiñas - 2002, Cuba
Oswaldo José Payá Sardiñas (1952 2012) é principalmente conhecido por ter fundado o Projeto Varela, que consistia numa campanha a favor de um referendo sobre a instauração de leis que garantam os direitos civis, as eleições pluralistas livres, a libertação de todos os presos políticos e as reformas económicas e sociais em Cuba.
Reformador ativo desde a juventude, Oswaldo Payá Sardiñas foi perseguido e condenado em diversas ocasiões pelas suas críticas sobre as políticas e injustiças de Fidel Castro, o que não o impediu, no entanto, de criar, em 1988, o Movimento Cristão de Libertação, atualmente um dos maiores movimentos da oposição em Cuba. Em 1990, Oswaldo Payá Sardiñas lançou um apelo de diálogo nacional e começou a recolher 10 000 assinaturas com vista a converter uma proposta civil em lei. Na sequência desta iniciativa foi detido pela polícia secreta.
Em 1997, elaborou o ambicioso Projeto Varela. Apesar da forte reação das autoridades contra este projeto popular, com a detenção dos seus defensores, Payá não desistiu e, em 2008, apresentou à Assembleia Nacional um projeto de lei de amnistia para os presos políticos. Em 2010, lançou igualmente o «Foro Todos Cubanos».
Em 2012, foi nomeado, pela sexta vez, para o Prémio Nobel da Paz. Nesse mesmo ano, em 22 de julho, perdeu a vida num acidente de viação em Cuba. Em sua homenagem, o Presidente do Parlamento Europeu, Martin Schulz, manifestou a sua convicção de que «as ideias de Oswaldo Payá irão perdurar dado que a sua obra e empenho inspiraram toda uma geração de ativistas cubanos na promoção da liberdade política e dos direitos humanos».
O Movimento Cristão de Libertação continua a exigir a clarificação das circunstâncias da sua morte. A família de Osaldo Payá rejeitou a versão oficial de acidente de viação e a sua filha, Rosa Maria, solicitou junto do Conselho dos Direitos do Homem das Nações Unidas e de outras organizações internacionais que se realizasse um inquérito internacional imparcial às causas da morte do seu pai, tendo denunciado a perseguição e as ameaças infligidas à família pelos agentes da segurança do Estado. Em junho de 2013, a família de Payá mudou se para os EUA, onde pensa viver temporariamente com o estatuto de refugiados políticos.
Kofi Annan, Secretário-Geral das Nações Unidas, e todo o pessoal dessa Organização - 2003, sede em Nova Iorque, EUA
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Ao atribuir às Nações Unidas, em 2003, o Prémio Sakharov, o Parlamento Europeu reconheceu os esforços envidados por esta organização a favor da paz, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais.
O Prémio Sakharov distinguiu, em especial, o pessoal das Nações Unidas, pelo seu trabalho incansável em prol da paz no mundo, muitas vezes em condições difíceis. A atribuição do prémio prestou homenagem, designadamente, à memória de Sérgio Vieira de Mello, Alto Comissário para os Direitos Humanos e um dos mais dignos representantes das Nações Unidas, que foi uma das vítimas mortais de um atentado terrorista contra o quartel general da organização em Bagdade, quando se encontrava no Iraque, em 2003, como enviado especial de Kofi Annan.
Kofi Annan foi o sétimo Secretário Geral das Nações Unidas. Ocupou este cargo de 1997 a 2006, tendo sido o primeiro a surgir de entre as fileiras do pessoal das Nações Unidas. Foi sempre um defensor dos direitos humanos, do Estado de direito, dos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio e do continente africano, e procurou aproximar as Nações Unidas do público mundial, estreitando vínculos com a sociedade civil, o setor privado e outros parceiros.
Em 2005, Kofi Annan apresentou à Assembleia Geral das Nações Unidas um relatório que, sob o título «Um conceito mais amplo da liberdade», expõe a sua visão de uma reforma global e profunda da organização. Este relatório conduziu nomeadamente à criação, em março de 2006, de um novo Conselho dos Direitos do Homem para substituir a antiga comissão do mesmo nome e modernizar as estruturas da organização mundial, a fim de promover e proteger os direitos fundamentais e tomar as medidas que se impõem contra os principais infratores aos direitos humanos.
Após ter completado dois mandatos como Secretário Geral das Nações Unidas, em 2007, Kofi Annan colaborou com várias organizações ativas a nível mundial e africano. Em 2012, assumiu o cargo de Enviado Especial Conjunto da ONU e da Liga Árabe na Síria, com o objetivo de encontrar uma solução para o conflito. Em 2013, foi nomeado presidente do grupo dos «Anciãos».
Associação de Jornalistas da Bielorrússia - 2004, Bielorrússia
Representando quase 1 000 profissionais que trabalham num ambiente caracterizado por dificuldades extremas, a Associação defende os direitos legítimos dos jornalistas, que não raramente são vítimas de intimidações, assédio, ações penais e expatriação.
O empenho da Associação de Jornalistas da Bielorrússia (AJB) a favor da causa da liberdade de opinião e da promoção de um jornalismo independente e profissional naquele país tem constituído uma fonte de inspiração. A AJB visa sensibilizar os cidadãos para o seu direito constitucional à liberdade de informação e para o exercício dos seus direitos. Defende os direitos dos jornalistas, sobretudo em tempos de crise, nomeadamente no período de violência que se seguiu às contestadas eleições presidenciais de 2010.
A AJB pretende liberalizar a regulamentação dos meios de comunicação social e incentivar a prática de um jornalismo de elevada qualidade, pautado pela ética. A AJB tem sido, desde a sua constituição, a principal associação representante da imprensa independente na Bielorrússia, cujo objetivo central consiste em prestar ao público informação objetiva, verídica, exaustiva e atempada.
Não obstante os grandes esforços de melhoria envidados, a situação dos meios de comunicação social na Bielorrússia está ainda longe de ser favorável. A lei relativa aos meios de comunicação social de 2009 permite às autoridades encerrar meios de comunicação que consideram ser excessivamente críticos.
Para poder operar na Bielorrússia, a imprensa estrangeira tem de obter uma licença, sendo que a ausência de acreditação constitui um obstáculo à colaboração dos jornalistas locais, que recebem advertências do KGB e do Ministério Público sempre que são apanhados. O Código Penal contém ainda disposições que penalizam a difamação de altos funcionários do Estado.
Em 2011, Andrzej Paczobut, membro da ABJ e correspondente do jornal diário polaco «Gazeta Wyborcza», foi condenado a três anos de prisão com pena suspensa. Em 2012, foi acusado várias vezes por força do mesmo artigo, embora o caso tenha acabado por ser encerrado. Os meios de comunicação social independentes são vítimas de discriminação económica: as maiores empresas de serviços postais, tipográficos e de distribuição são geridas pelo Estado, podendo recusar se a prestar serviços a alguns meios de comunicação mais acutilantes, como no caso dos jornais regionais «Novy Chas», «Gazeta Slonimskaya» e «Intex Press».
Repórteres sem Fronteiras - 2005, sede em França
Segundo os Repórteres Sem Fronteiras, mais de um terço da população mundial vive em países onde não existe liberdade de imprensa. Em 2012, o barómetro da liberdade de imprensa dos Repórteres sem Fronteiras registou um total de 50 jornalistas mortos e 147 detidos no exercício da sua profissão ou por motivos respeitantes à mesma.
Esta organização acompanha e denuncia constantemente os atentados à liberdade de informação cometidos a nível mundial, combate a censura e as leis destinadas a restringir a liberdade de informação, apoia moral e financeiramente os jornalistas perseguidos e as suas famílias e presta assistência material aos correspondentes de guerra, a fim de reforçar a sua segurança. A fim de assegurar o julgamento dos assassinos e de todos quantos infligem torturas a jornalistas, a rede dos Repórteres Sem Fronteiras faculta, desde 2002, assistência jurídica às vítimas e representa as nos tribunais.
Editado em várias línguas, o sítio web dos Repórteres Sem Fronteiras contém informações atualizadas diariamente sobre os atentados à liberdade de imprensa perpetrados em todo o mundo e oferece a possibilidade de assinatura de petições em linha de apoio a jornalistas presos. Para combater a censura, publica ocasionalmente artigos que foram proibidos no país de origem, alberga jornais encerrados no respetivo país e funciona como um fórum no qual os jornalistas «silenciados» pelas autoridades nacionais podem fazer ouvir a sua voz.
Na qualidade de laureada com o Prémio Sakharov, a organização Repórteres Sem Fronteiras reuniu outros laureados e coordenou as atividades.
Hauwa Ibrahim - 2005, Nigéria
Advogada defensora dos direitos humanos e mãe de dois filhos, nascida na Nigéria em 1967 numa aldeia pequena e pobre, filha de um mullah, Hauwa Ibrahim não parecia destinada a uma carreira de advogada. Deveria ter-se casado aos dez anos e abandonar os estudos após o ensino primário. Porém, Hauwa Ibrahim rebelou se contra este destino.
Sendo uma das poucas advogadas que exercem no norte da Nigéria, a sua atividade levou a até ao interior rural, viajando, por vezes, em dorso de camelo ou de burro. Este período é descrito como o melhor da sua vida, por lhe ter permitido estar em contacto com as suas próprias raízes.
Hauwa Ibrahim criou o que pode ser considerado uma especialidade extraordinária: defender pessoas condenadas de acordo com a charia islâmica, aplicada em 12 Estados do norte da Nigéria. As condenações à morte, embora não sejam presentemente executadas, continuam a ser pronunciadas. Desde 1999, Hauwa Ibrahim foi advogada de defesa, sem receber honorários, em mais de 150 processos, muitos dos quais implicando mulheres acusadas de adultério e condenadas à pena de morte por lapidação e crianças condenadas à amputação dos seus membros. A sua desenvoltura profissional em tribunal, o apoio dos Advogados Sem Fronteiras e a atenção dedicada pelos meios de comunicação social internacionais e nacionais e pela opinião pública salvaram as vidas de Amina Lawal, Safiya Hussaini, Hafsatu Abukabar e de muitas outras.
Hauwa Ibrahim está perfeitamente ciente da importância da educação como forma de emancipação das mulheres: a pobreza e o analfabetismo são inseparáveis e o fundamentalismo alimenta se da ignorância. Hauwa Ibrahim, que recebeu uma educação islâmica, mantém uma luta constante contra o fundamentalismo religioso.
Em 2012, publicou a obra «Practicing Shariah Law. Seven Strategies for Achieving Justice in Shariah Courts» (Exercer no âmbito da charia. Sete estratégias para alcançar a justiça em tribunais da charia), que oferece uma visão realista das complexidades da charia, e que escreveu enquanto era professora convidada na Harvard Divinity School (2010 2013).
Atualmente, a voz de Hauwa Ibrahim ecoa para além das fronteiras da Nigéria, mas não no seu próprio país.
Damas de Branco - 2005, Cuba
Em 2013, as Damas de Branco de Cuba puderam finalmente usar da palavra perante o Parlamento Europeu e aceitar pessoalmente o Prémio Sakharov que lhes fora atribuído em 2005.
A Presidente Berta Soler e as representantes Belkis Cantillo Ramirez e Laura Maria Labrada Pollán, filha da tão amada cofundadora Laura Pollán, que faleceu em 2011, foram autorizadas a sair de Cuba depois de as autoridades cubanas terem amenizado, em janeiro, as restrições de viagem impostas aos cidadãos.
Berta Soler comparou o Prémio Sakharov a «um escudo» que iria proteger as Damas de Branco no seu regresso a casa.
Em 2005, o Parlamento Europeu reconheceu a sua coragem e empenho na causa dos direitos humanos em Cuba e chamou a atenção para a detenção de 75 dissidentes políticos, desde março de 2003 (a apelidada «Primavera Negra de Cuba»), na maioria dos casos apenas por terem criticado a falta de liberdade política no país.
O movimento das Damas de Branco constituiu se de forma espontânea em resposta à detenção dos seus maridos e familiares na repressão da «Primavera Negra». As Damas de Branco desfilaram pelas ruas e escreveram cartas às autoridades cubanas solicitando a libertação dos presos, mas não obtiveram uma única resposta. No entanto, as suas ações de protesto persistentes foram profícuas: os dois últimos prisioneiros da «Primavera Negra» foram libertados em março de 2011. A maior parte aceitou o exílio em Espanha e um número reduzido decidiu ficar em Cuba, prosseguindo a sua luta em condições adversas e com grande sacrifício pessoal.
Mesmo após a libertação dos seus entes queridos da prisão, as Damas de Branco continuaram a desfilar, todos os domingos, pelas ruas de Havana, com flores na mão, em prol da justiça social em Cuba. O grupo foi crescendo, não obstante as dificuldades de comunicação, os espancamentos, as detenções e o assédio psicológico infligidos.
Em abril de 2013, logo após a cerimónia de entrega do Prémio Sakharov, as Damas de Branco e outros dissidentes, nomeadamente o laureado de 2010, Guillermo Fariñas, criaram a Plataforma Internacional para os Direitos Humanos em Cuba.
Aliaksandr Milinkevich - 2006, Bielorrússia
Alexander Milinkevich, líder da oposição democrática na Bielorrússia, foi escolhido, em outubro de 2005, pela Oposição Democrática Unida como candidato comum às eleições presidenciais. Recolheu mais de 100 000 assinaturas de apoio durante a campanha para as eleições presidenciais de 19 de março de 2006.
Alexander Milinkevich apelou a um futuro verdadeiramente democrático para o seu país e apresentou se como uma alternativa efetiva ao autoritarismo do Presidente Lukashenko. A vitória do Presidente Lukashenko foi duramente criticada pela oposição na Bielorrússia e no estrangeiro por razões de fraude eleitoral. Após contestar esta vitória, Alexander Milinkevich foi preso sob diversos pretextos, mas não foi formulada qualquer acusação formal.
Ao ser indagado sobre o facto de a atribuição do Prémio Sakharov ter contribuído ou não para a sua atividade política, Alexander Milinkievich afirmou que «temos de ser nós a operar a mudança no país, para o tornar democrático e livre. No entanto, a solidariedade demonstrada pelos dirigentes europeus é muito importante. Quanto mais apoio tivermos da parte do Parlamento Europeu e dos dirigentes europeus, mais difícil será para um ditador continuar a exercer repressão».
Alexander Milinkevich não se candidatou às eleições presidenciais de 2010 por considerar que a lei eleitoral nacional não foi alterada de modo a permitir a realização de eleições justas, livres e abertas.
Na qualidade de laureado com o Prémio Sakharov, Alexander Milinkevich participou em várias conferências sobre os direitos humanos, organizadas pelo Parlamento Europeu, por grupos de reflexão e por organizações da sociedade civil. Nas suas intervenções, manifestou preocupação quanto às políticas repressivas conduzidas pelo regime ditatorial no poder, apontando para uma situação económica crítica na Bielorrússia com o aumento do défice orçamental, que comporta uma verdadeira dependência, nomeadamente, da Rússia. Alexander Milinkevich apelou ao desenvolvimento democrático e ao reforço das relações do seu país com a União Europeia e os EUA.
Após as eleições de 2010, a situação dos direitos humanos na Bielorrússia deteriorou se ainda mais, tendo as autoridades adotado uma lei que penaliza as atitudes consideradas de crítica em relação ao Estado. Prosseguem, ainda hoje, o silenciamento e a prisão de jornalistas, ativistas e outros críticos do atual regime.
Salih Mahmoud Mohamed Osman - 2007, Sudão
Salih Mahmoud Osman vinha, há mais de duas décadas, a prestar assistência jurídica gratuita às pessoas detidas arbitrariamente, torturadas e vítimas de graves violações dos direitos humanos no Sudão, quando o Parlamento Europeu lhe atribuiu, por unanimidade, o Prémio Sakharov em 2007.
Hans-Gert Pöttering, Presidente do Parlamento Europeu na altura, afirmou na cerimónia de entrega do prémio a Osman que «em nome da dignidade humana, Salih Osman assegura aos homens e às mulheres indigentes, indefesos, intimidados e votados ao esquecimento que o mundo está ciente do seu sofrimento». «Em nome da justiça, Salih Osman luta dia após dia para garantir que os autores de crimes de guerra respondam por eles tanto a nível nacional como internacional».
No seu discurso de agradecimento pela atribuição do prémio, Salih Osman disse: «Sou natural do Darfur e nasci em Jebel Marra, uma região montanhosa situada no centro do Estado do Darfur. Durante muitos anos, trabalhei como advogado no Darfur, no Sudão. Fui detido e torturado por razões ligadas às minhas atividades. Membros da minha própria família foram torturados e deslocados pela milícia do Darfur. Durante muitos anos, no âmbito do meu trabalho, representei milhares de pessoas que precisavam da minha ajuda nos tribunais. Vi milhares de pessoas que tinham sido torturadas; vi centenas de mulheres e raparigas que tinham sido vítimas de abuso sexual».
Salih Osman participa ativamente na proteção de milhões de sudaneses que foram obrigados a abandonar as suas casas. Repertoriou crimes perpetrados, sobretudo na região do Darfur, e lançou uma campanha para que a violação seja considerada um crime de guerra.
Entre 2005 e 2010, foi membro da oposição no Parlamento sudanês.
Hu Jia - 2008, China
Hu Jia, dissidente e prisioneiro político chinês, foi libertado quando o Parlamento Europeu o galardoou por ocasião do 20.º aniversário do Prémio Sakharov, em virtude dos seus apelos à realização de um inquérito oficial sobre o massacre ocorrido na Praça de Tiananmen e à indemnização das famílias das vítimas, do seu ativismo em prol do ambiente e do seu trabalho de luta contra a SIDA. Hu Jia abordava o problema da SIDA numa época em que o VIH/Sida ainda era um assunto proibido na China e o número de casos presumíveis era considerado um «segredo de Estado».
Hu Jia é igualmente um dos coordenadores do movimento dos «Advogados de Pés Descalços», um grupo informal de consultores jurídicos que defendem os defensores dos direitos humanos na China.
Em 2007, deu, através de uma conferência telefónica, o seu corajoso testemunho à Subcomissão dos Direitos do Homem do Parlamento Europeu, chamando a atenção para o facto de o departamento de segurança nacional chinês perseguir um milhão de pessoas por lutarem pelos direitos humanos, sendo que muitas dessas pessoas se encontram detidas em prisões, em campos de trabalhos forçados ou em hospitais psiquiátricos.
Como resultado direto desta sua comunicação, Hu Jia foi detido em 27 de dezembro de 2007, tendo sido acusado de «incitar à subversão do poder estatal», condenado, em 3 de abril de 2008, a três anos e meio de prisão e privado dos seus direitos políticos durante um ano.
Quando lhe foi atribuído o Prémio Sakharov, foi coagido a renunciar ao mesmo pela polícia de segurança do Estado, inclusivamente por intermédio dos seus pais.
No entanto, Hu Jia aceitou corajosamente o prémio, qualificando o de «importante prémio para a China». Numa mensagem vídeo proferida em seu nome, Zeng Jinyanin, sua mulher e conomeada para o prémio em 2007, declarou que se tratava de uma afirmação para os defensores dos direitos humanos na China no seu longo e difícil périplo de defesa dos direitos humanos, pela qual eles e os seus familiares pagavam muito caro.
Numa carta endereçada ao Presidente do Parlamento Europeu em julho de 2012, Hu Jia afirmou considerar o prémio «uma grande honra» que «lhe dava coragem e melhorava consideravelmente a forma como era tratado na prisão».
Libertado em junho de 2011, Hu Jia continua a ser um dissidente confesso e um defensor da mudança na China, não obstante os constantes assédios, espancamentos e detenções arbitrárias.
Memorial - 2009, Rússia
Oleg Orlov, Sergei Kovalev e Lyudmila Alexeyeva, em nome do Memorial e de todos os outros defensores dos direitos humanos na Rússia, foram galardoados com o Prémio Sakharov em 2009.
A organização «Memorial» foi fundada em 1988 como um grupo informal de cidadãos, tendo Andrei Sakharov entre os seus fundadores, centrando-se nos pontos nevrálgicos dos conflitos armados e acompanhando e tornando públicas as violações sistemáticas dos direitos humanos nos antigos países da URSS.
Esta organização encontra se permanentemente sob a pressão exercida pelas autoridades russas, vendo os seus membros e indivíduos estreitamente associados ameaçados, raptados e até assassinados.
Em 2013, na sequência de uma Lei de novembro de 2012 que impõe às ONG a obrigatoriedade de receberem financiamento proveniente do estrangeiro para poderem registar se como «agentes estrangeiros», os escritórios do Memorial foram alvo de buscas levadas a cabo pelo Ministério Público. O Memorial resistiu à coação para efetuar o registo como agente estrangeiro e contestou a ação do Ministério Público junto do tribunal, mas a primeira instância deu provimento à legalidade das buscas.
Oleg Orlov, membro do Conselho do Memorial e dirigente desta organização desde 1994, trabalhou na Chechénia em circunstâncias de guerra muito perigosas. Em 2007, Oleg Orlov foi sequestrado, espancado e ameaçado de morte por funcionários do governo na Inguchétia.
Sergei Kovalev é o atual Presidente do Memorial russo. Passou dez anos (1974 1984) num campo de trabalhos forçados e no exílio pelo facto de ter editado a revista clandestina e dissidente «Crónica da atualidade». Presidiu igualmente o Comité, do qual Oleg Orlov fez parte, que em 1995 negociou a libertação de cerca de 2 000 pessoas feitas reféns no ataque ao hospital de Budennovsk pelos rebeldes chechenos. O ataque marcou o fim da primeira guerra chechena e foi a única vez em que um ataque terrorista na Rússia não implicou um assassinato massivo dos reféns.
Lyudmila Alexeyeva é dirigente e cofundadora do Grupo Moscovo Helsínquia. Nascida em 1927, é uma das poucas dissidentes da era soviética ainda no ativo na Rússia moderna, sendo conhecida por lutar por um julgamento justo dos dissidentes presos e por uma cobertura mediática objetiva dos processos.
Guillermo Fariñas – 2010, Cuba
Doutorado em psicologia, jornalista independente e dissidente político em Cuba, Guillermo Farinãs efetuou 23 greves de fome ao longo dos anos para protestar contra o regime cubano, com o objetivo de promover uma mudança política pacífica, a liberdade de opinião e a liberdade de expressão no seu país.
Como jornalista, fundou uma agência noticiosa independente, a Cubanacán Press, para informar o resto do mundo sobre o destino dos prisioneiros políticos em Cuba. No entanto, as autoridades acabaram por forçá lo a encerrar essa agência noticiosa.
Em fevereiro de 2010, após a morte controversa de Orlando Zapata, Fariñas iniciou uma greve de fome que só terminou em julho desse mesmo ano, após o Governo cubano ter anunciado que estava em vias de libertar 52 presos políticos. Nessa altura, Fariñas, que reclamava a libertação de prisioneiros políticos que tinham adoecido após muitos anos de detenção, recusava alimentos e líquidos há mais de 130 dias.
Guillermo Fariñas não pôde participar na cerimónia de entrega do Prémio Sakharov de 2010 no Parlamento Europeu porque não foi autorizado a sair de Cuba. Em julho de 2012 foi detido por ocasião do funeral de outro dissidente cubano e vencedor do Prémio Sakharov, Oswaldo Payá, tendo sido preso temporariamente.
Depois de o Governo cubano ter abrandado as restrições em matéria de viagens impostas aos Cubanos e no seguimento do regresso das Damas de Branco a Cuba, após a sua visita ao Parlamento Europeu em abril de 2013, teve igualmente lugar no PE, em 3 de julho de 2013, uma cerimónia tardia de entrega do Prémio Sakharov em honra de Guillermo Fariñas.
No seu discurso de agradecimento, Fariñas afirmou: «Estou aqui, hoje, não porque a situação tenha mudado fundamentalmente, mas por causa das realidades do mundo moderno e, sobretudo, por causa do crescente desprezo cívico dos Cubanos que obrigou o regime - para utilizar as palavras do legendário príncipe Dom Fabrizio de «O Leopardo» - a "mudar tudo para que tudo fique na mesma"».
Razan Zaitouneh – 2011, Síria
Razan Zaitouneh é uma jornalista síria e advogada no domínio da defesa dos Direitos Humanos, que foi sequestrada numa zona controlada pelos rebeldes nos subúrbios de Damasco, em 9 de dezembro de 2013. Pensa-se que esteja bem, mas o seu paradeiro e os raptores são ainda desconhecidos. Apesar de ameaçada, Razan Zaitouneh denunciou corajosamente as violações dos Direitos Humanos pelo regime de Damasco e pelos rebeldes.
Foi sequestrada com o marido e também ativista Wael Hamada e dois colegas, o poeta e advogado Nazem Hamadi e a ex presa política Samira Khalil, no escritório dos dois grupos que fundou, o Centro de Documentação de Violações e o Gabinete de Apoio ao Desenvolvimento Local e aos Pequeno Projetos, em Douma. Zaitouneh é uma das ativistas civis mais importantes e credíveis da revolução síria. O seu rapto é considerado por analistas sírios como um episódio decisivo na cisão atual na Síria entre as forças civis e os extremistas, e um evento que constituiu um golpe fatal para a revolução síria.
A sua família já apelou à ajuda internacional para que Zaitouneh e os seus colegas sejam encontrados.
«Nós, família de Razan Zeitouneh, militante dos Direitos Humanos, advogada, escritora e, acima de tudo, um ser humano, fazemos esta declaração mais de três meses após o sequestro deliberado e que nenhum partido ainda reivindicou, sobre o qual não proferiu qualquer declaração ou apresentou pedido, numa clara tentativa de ganhar tempo e de calar a voz livre da nossa filha, juntamente com os seus colegas, para os forçar a deixar de escrever e para lhes coartar o direito à liberdade de expressão», declarou a família num comunicado divulgado em abril de 2014 e publicado pelo Centro de Documentação de Violações.
Militantes e políticos de todo o mundo, incluindo o presidente Martin Schulz, têm apelado à sua libertação: «Em nome do Parlamento Europeu, apelo à sua libertação imediata... A sua vida foi ameaçada pelo regime e pelos grupos rebeldes por aquilo que ela é, uma jovem corajosa que se recusa a ceder e continua a lutar pacificamente pela democracia e uma Síria livre».
Os Repórteres Sem Fronteiras, laureados do Prémio Sakharov, e 45 outras ONG fizeram um apelo conjunto para a sua libertação e dos ativistas com ela sequestrados.
Quando o prémio lhe foi atribuído, em 2011, Razan Zeitouneh vivia na clandestinidade, depois de ter fugido de um ataque à casa onde vivia perpetrado por agentes de segurança do Estado. Razan Zeitouneh consagrou o montante do Prémio Sakharov que lhe foi atribuído a salvar a vida de um ativista atingido por disparos de um tanque.
Ahmed El Zuber El Senussi – 2011, Líbia
Ahmed al-Sanusi, nascido em 1934, é o prisioneiro de consciência que mais anos de pena cumpriu na Líbia. Foi acusado de conspiração numa tentativa de golpe de Estado contra o regime de Muammar Kadhafi em 1970, tendo passado 31 anos na prisão. Foi libertado em agosto de 2001, juntamente com dezenas de outros prisioneiros políticos.
Enquanto membro do Conselho Nacional de Transição, instituído em 2011 depois de a revolução ter derrubado o regime de Kadhafi, encarregou se dos prisioneiros políticos. Atualmente, prossegue a sua obra corajosa em prol da melhoria da situação dos direitos humanos e do Estado de direito na Líbia e considera que o Prémio Sakharov com que foi galardoado constitui se destina a todo o povo líbio.
Na cerimónia de entrega do seu prémio, afirmou: «Este prémio tem um enorme valor simbólico e moral e fornece um estímulo adicional à consolidação dos valores que sempre defendemos, como a criação de um Estado democrático, constitucional e assente na igualdade de todos, um Estado em que as mulheres gozem do direito de voto e de elegibilidade nas eleições para fazerem ouvir a sua voz».
Em outubro de 2012, na reunião da Rede do Prémio Sakharov realizada nas instalações do Parlamento Europeu, debateu as consequências da revolução e do conflito armado na Líbia e o futuro da democracia nos países árabes no seguimento da Primavera Árabe.
Na primeira edição do Fórum Mundial da Democracia realizada no Conselho da Europa, para a qual foi convidado na qualidade de laureado com o Prémio Sakharov, Ahmed al-Sanusi denunciou a ausência de um governo eficaz na Líbia, chamando a atenção para os raptos, a tortura, a vigilância permanente e as chantagens que assolam a sociedade líbia.
Declarou que o seu apelo à instituição de um sistema federal suscitou acusações de traição, designadamente por parte dos imãs. Segundo afirmou Ahmed al-Sanusi, estas acusações foram uma clara tentativa de interpretação errónea da sua proposta e de manchar a reputação daqueles que querem melhorar a situação.
Asmaa Mahfouz – 2011, Egito
Nascida em 1985, Asmaa Mahfouz é uma defensora dos direitos humanos egípcia que desafiou a repressão exercida pelo regime de Mubarak sobre os ativistas em linha difundindo um apelo em vários meios de comunicação da Internet para levar os egípcios a reclamar o respeito da liberdade, da dignidade e dos direitos humanos através de um protesto pacífico na Praça Tahrir, em 25 de janeiro de 2011.
O vídeo propagou-se rapidamente como um vírus, inspirando uma onda de vídeos semelhantes e tendo como consequência o ajuntamento de centenas de milhares de pessoas na Praça Tahrir para reclamar o fim do regime de 30 anos de Hosni Mubarak no Egito, o que viria a concretizar se no dia 11 de fevereiro de 2011.
No seu segundo vídeo, Asmaa Mahfouz divulgou a seguinte mensagem: «Se te consideras um homem, junta te a mim no dia 25 de janeiro. Quem diz que as mulheres não devem participar em manifestações porque serão espancadas deveria ter honra e hombridade para se juntar a mim no dia 25 de janeiro.
A quem diz que não vale a pena porque só lá estarão meia dúzia de pessoas, gostaria de dizer que é a eles que se deve tudo isto, que são traidores, tal como o Presidente ou os agentes de segurança que nos espancam nas ruas"».
No final de 2011, Asmaa Mahfouz, uma das cofundadoras do movimento de jovens «6 de abril», foi detida e acusada de difamação dos governantes militares egípcios por os apelidar de «conselho de cães». Seguidamente, foi julgada por um tribunal militar, tendo, no entanto, sido libertada sob caução. Em 23 de outubro de 2011, Asmaa Mahfouz realizou um colóquio na Praça da Liberdade durante um espetáculo de apoio ao movimento «Ocuppy Wall Street».
Foi um dos principais oradores na reunião da Rede do Prémio Sakharov realizada em outubro de 2012, nas instalações do Parlamento Europeu, em Bruxelas, onde se debateu a evolução da situação no Egito após a revolução e o futuro da democracia nos países árabes no seguimento da Primavera Árabe.
Ali Ferzat – 2011, Síria
Ali Ferzat é um conhecido autor de sátira política de nacionalidade síria e uma das figuras culturais mais famosas do mundo árabe. Nascido em Hama, em 1941, publicou mais de 15 000 caricaturas em jornais sírios e internacionais. Os seus desenhos mudaram as fronteiras da liberdade de expressão na Síria.
Em 2011, quando explodiu a onda de rebelião da Primavera Árabe e os Sírios começaram a manifestar se contra o regime de Bashar al-Assad, as suas caricaturas eram exibidas nas ruas. Devido à sua atitude crítica em relação ao regime, foi violentamente agredido em público por um grupo de indivíduos encapuzados, que o deixaram quase morto nas ruas de Damasco. Ficou com ambas as mãos fraturadas, naquilo que os encapuzados apelidaram de aviso por ter desonrado os seus líderes.
Ali Ferzat não só recuperou o uso das mãos, como rompeu a barreira do medo ao tornar se um dos mais acérrimos críticos do regime através das suas palavras e da sua arte.
Ferzat opõe se à ideia de uma guerra civil na Síria. Antes de mais, e tal como afirmou ao Oslo Freedom Forum (Fórum da Liberdade de Oslo) em 2013, há, por um lado, o regime e os seus aliados estrangeiros, ou seja, a Rússia, o Irão e o Hezbollah, e, por outro, o povo sírio.
Impossibilitado de assistir à cerimónia do Prémio Sakharov em 2011 por estar a receber tratamento das suas lesões corporais no Koweit, o prémio ser lhe ia entregue por ocasião do debate público da Rede do Prémio Sakharov realizado nas instalações do Parlamento Europeu em outubro de 2012, onde aproveitou o ensejo para debater com o Presidente do PE e outros laureados a revolução em curso na Síria e o futuro da democracia no seguimento do despertar árabe.
Na qualidade de laureado com o Prémio Sakharov, dirigiu se à primeira edição do Fórum Mundial da Democracia, organizado pelo Conselho da Europa. Nessa ocasião, Ferzat afirmou que enquanto a revolução estivesse a decorrer na Síria, esta seria uma batalha ganha, porque já não se volta para trás.
Ali Ferzat foi eleito pela Time Magazine como uma das 100 pessoas mais influentes do mundo em 2012 e ganhou vários prémios dos direitos humanos.
Mohamed Bouazizi – 2011, Tunísia
Mohamed Bouazizi, vendedor de legumes natural de Sidi Bouzid, tornou se uma lenda na Tunísia e no mundo árabe e um símbolo para os tunisinos que lutavam pela democracia e pela liberdade. Em 4 de janeiro de 2011, faleceu com a idade de 26 anos, tendo-se imolado pelo fogo em sinal de protesto contra um sistema que o impedia, a si e à sua família, de levar uma vida digna.
Por diversas ocasiões, havia sido vítima das forças policiais tunisinas, procurando sempre que se fizesse justiça, embora isso nunca tenha acontecido. Pelo contrário, foi humilhado e desalentado. Em desespero de causa, imolou se pelo fogo. A sua morte contribuiu para incitar à revolta popular que derrubou o Governo do Presidente Zine El Abidine Ben Ali.
O ato de Mohamed Bouazizi impulsionou a chamada «revolução popular» e abalou os governos despóticos, mesmo noutras partes do mundo árabe, sensibilizando os jovens árabes para o facto de que já não tinham de ficar calados perante as injustiças, a corrupção e um regime autocrático: podiam expor as suas frustrações e lutar pela dignidade. Todavia, atualmente, na Tunísia e noutros países árabes, o otimismo desencadeado pela autoimolação de Mohamed Bouazizi e pela subsequente revolta popular esmoreceu face à realidade cruel de que a vida na Tunísia e noutras partes do mundo não melhorou de um dia para o outro depois da Primavera Árabe.
Jafar Panahi - 2012, Irão
Jafar Panahi é um cineasta iraniano que foi proibido de realizar filmes durante 20 anos. Apoiante declarado do «movimento verde» de oposição no Irão e crítico do então Presidente Ahmadinejad, foi condenado a uma pena de seis anos de prisão por «propaganda contra a República Islâmica». Hoje, vive numa espécie de limbo, estando proibido de sair do país ou de falar com os meios de comunicação social; paira sobre ele a ameaça da detenção.
Na sua obra, inspirado pelo realismo e por uma perspetiva humanista da vida, Jafar Panahi focou a sua objetiva na dureza das condições de vida das crianças iranianas, dos pobres e, em especial, das mulheres depois da revolução islâmica, incorrendo a ira e a censura das autoridades iranianas. Os seus filmes premiados estão proibidos no Irão e levaram no à prisão em mais do que uma ocasião. Em 2010, foi detido juntamente com a mulher e a filha e 15 amigos, tendo sido todos libertados mais tarde. Em 2011, realizou «Isto não é um filme», que mostra o cineasta sentado à mesa da sua cozinha, onde fala com a filha aguardando a detenção.
O Presidente do Parlamento Europeu, Martin Schulz, afirmou: «A atribuição do Prémio Sakharov para a Liberdade de Pensamento 2012 a Nasrin Sotoudeh e a Jafar Panahi é uma mensagem de solidariedade e de admiração relativamente a uma mulher e a um homem que não cederam ao medo e à intimidação e que decidiram colocar o destino do seu país à frente dos seus próprios destinos».
A filha de Panahi, Solmaz, e o diretor da Cinemateca francesa, Serge Toubiana, representaram no na cerimónia do Prémio Sakharov realizada nas instalações do Parlamento Europeu, e o seu amigo e aclamado cineasta Costa Gavras leu o seu discurso de agradecimento.
Panahi disse: «Há dois anos, ao ser condenado, um amigo perguntou me qual era exatamente o significado da condenação. Segundo esse amigo, a mensagem da condenação era a de que devia fugir do país e nunca mais voltar.
É óbvio que optei por ficar, apesar de já não poder utilizar a minha câmara para chegar ao coração da sociedade e fazer a única coisa que sei fazer: cinema. Não poder fazer filmes é uma morte lenta para um realizador».
Nasrin Sotoudeh - 2012, Irão
Nasrin Sotoudeh foi distinguida com o Prémio Sakharov quando cumpria o segundo ano de uma pena de prisão de seis anos, na famosa cadeia iraniana de Evin.
Presa por ter defendido corajosamente os manifestantes detidos nos protestos em massa de 2009 contra as eleições presidenciais que consideravam ser fraudulentas, Nasrin foi colocada em regime de isolamento e empreendeu uma greve de fome de sete semanas para protestar contra a pressão exercida sobre a sua família, nomeadamente a proibição de viajar imposta à sua filha de 12 anos de idade. Esta proibição foi levantada posteriormente e Nasrin acabou por abandonar a greve de fome, declarando que a retomaria se o marido, que continuava impedido de viajar, fosse levado a tribunal.
Não obstante o estado de extrema fraqueza e fragilidade, encontrou força e coragem para escrever uma mensagem memorável ao Parlamento Europeu, que foi lida em seu nome na cerimónia de entrega pela sua colega e amiga Shirin Ebadi, laureada com o Prémio Nobel da Paz.
Nasrin Sotoudeh afirmou: «A história dos direitos humanos e dos mecanismos para a sua salvaguarda tem origens longínquas, mas a sua concretização depende ainda, em larga medida, das intenções dos governos, que são os maiores violadores dos direitos humanos».
Apelando à aplicação dos direitos humanos em todo o mundo, Nasrin identificou a sua violação como a causa principal da onda revolucionária que varre o Médio Oriente. Dirigiu se aos defensores dos direitos humanos e aos prisioneiros políticos declarando que «tal como vós, também eu sei que a democracia ainda tem um longo e difícil caminho a percorrer.
Basta recordar que durante os anos em que a luta de Martin Luther King contra a discriminação racial produzia resultados, noutra parte do mundo, Nelson Mandela iniciava uma pena de prisão de três décadas pela sua luta contra a discriminação racial e, no ano em que foi libertado, uma ativista noutro continente, na Birmânia, passava cerca de duas décadas em prisão domiciliária por defender a liberdade.
Agora que Aung San Suu Kyi foi libertada, os Iranianos que reclamam a liberdade e recorrem a métodos totalmente pacíficos são condenados a longas penas de prisão por quererem a liberdade. Todos estes são sinais de uma verdade. A tocha da liberdade passa de mão em mão, mas nunca se apagará».
Malala Yousafzai - 2013, Paquistão
Malala Yousafzai é uma jovem paquistanesa de 16 anos de idade, que foi atingida a tiro na cara pelos Talibãs para impedirem que ela e outras colegas fossem à escola.
«Eles deram-lhe um tiro na cabeça à queima-roupa e tornaram-na mais forte», declarou Angelina Jolie, atriz de Hollywood, no lançamento de um primeiro projeto para ajudar 40 rapariga sno Vale de Swat, no Paquistão, a ir à escola.
Malala recuperou dos ferimentos após um longo período de tratamento no Reino Unido, onde vive atualmente, e afirmou que pretende que «cada rapariga, cada criança, tenha acesso à educação».
A sua luta teve início aos 11 anos, quando escreveu um diário anónimo sobre a vida de uma jovem estudante sob o domínio dos talibãs no Vale de Swat, no Paquistão, para a página na Internet da BBC em língua urdu.
Na quarta-feira, 14 de Janeiro de 2009, a entrada na página referia «talvez não vá mais à escola». O diretor da sua escola anunciara o início das férias de inverno, mas não a data de reinício das aulas. Em 15 de janeiro de 2009, os talibãs decretaram o encerramento de todas as escolas de raparigas no Vale de Swat. Mais de 150escolas já tinham sido destruídas por explosões.
Pouco depois, Malala e a família tiveram de fugir da cidade sitiada de Mingora, enquanto os talibãs e o exército paquistanês lutavam para tomar o controlo da cidade. A escola de Malala foi devastada.
De regresso a casa, após a segurança ter melhorado, Malala e o pai, Ziauddin, membro liberal da jirga, que dirige uma escola de raparigas, foram alvo de ameaças. Contudo, Malala continuou a defender o acesso das raparigas à educação em entrevistas sem reservas e presenças na televisão, voluntariando-se para dois documentários sobre a educação das raparigas no Vale de Swat, intitulados Class dismissed in Swat Valley (O fim das aulas no Vale de Swat) e A schoolgirl's odyssey (A odisseia de uma jovem estudante). Malala adquiriu um autocarro escolar através de donativos e foi no regresso a casa, nesse mesmo autocarro, que foi atingida a tiro, e duas outras jovens foram também feridas, num ataque reivindicado pelo partido Tehrik-e-Taliban.
O ataque tinha por objetivo assassinar Malala e «dar uma lição» a todos os que estivessem associados a ela ou à sua luta pelo direito à educação, à liberdade e à autodeterminação das raparigas e mulheres no Paquistão. No entanto, Malala continua a lutar.
No dia em que completou 16 anos, em 12 de julho de 2013,Malala discursou na sede das Nações Unidas, num evento organizado pelo Enviado Especial das Nações Unidas para a Educação Global, Gordon Brown.
«Os terroristas pensaram que iam alterar os meus objetivos e acabar com as minhas ambições», declarou, «mas nada mudou na minha vida, à exceção do seguinte: a fraqueza, o medo e o desespero morreram. A força, o poder e a coragem nasceram».
As Nações Unidas elegeram o dia 10 de Novembro como o Dia de Malala, para chamar a atenção para o direito das raparigas a frequentar a escola, e o Paquistão e a Unesco criaram o Fundo Malala para a educação de raparigas.
Denis Mukwege - 2014, República Democrática do Congo
Denis Mukwege é um médico congolês que dedica a sua vida à reconstrução dos corpos e das vidas de dezenas de milhares de mulheres e raparigas congolesas, vítimas de violações coletivas e de violência sexual brutal na guerra em curso na República Democrática do Congo.
Nascido em Bukavu em 1955, Mukwege estudou medicina e fundou o serviço de ginecologia do Hospital Lemera na parte oriental da República Democrática do Congo. O médico fugiu para Bukavu e aí abriu um hospital composto por tendas, tendo construído uma nova maternidade e um bloco operatório. Porém, tudo foi destruído em 1998 durante a segunda guerra do Congo.
Sem se deixar demover, Mukwege voltou a construir o seu hospital, desta vez em Panzi, trabalhando horas a fio e preparando os funcionários para o tratamento de mulheres que tivessem sido vítimas dos combatentes, os quais haviam "declarado as mulheres como seu inimigo comum". Mukwege já tratou mais de 40 mil mulheres desde que o hospital abriu pela primeira vez em 1999, altura em que recebeu a sua primeira vítima de violação apresentando feridas de balas nas coxas e nos órgãos genitais. Algumas semanas depois, dúzias de mulheres dirigiram-se ao hospital, afirmando terem sido violadas e torturadas.
"Comecei a perguntar-me o que é que se estava a passar", declarou Mukwege à BBC. "Estes não eram apenas atos violentos de guerra, mas antes, parte da própria estratégia... Várias pessoas foram violadas simultânea e publicamente. Uma aldeia inteira pode ser violada durante a noite. Deste modo, eles não causam apenas sofrimento às vítimas, mas também a toda uma comunidade, que é forçada a assistir. Como consequência desta estratégia, as pessoas veem-se obrigadas a abandonar a sua aldeia, os seus campos, os seus recursos, tudo."
Mukwege é reconhecido internacionalmente como sendo um perito na reparação dos danos patológicos e psicossociais resultantes da violência sexual. O Hospital Panzi disponibiliza cuidados físicos e psicológicos, ajudando as mulheres a desenvolverem novas competências para a vida e as raparigas a voltarem à escola. É também providenciado o apoio jurídico necessário para levar os seus agressores a tribunal.
O médico congolês tem vindo a lutar incansavelmente pela defesa dos direitos da mulher e pelo fim da violência gerada em torno da disputa pelos recursos naturais do Congo. O próprio Dr. Mukwege também se tornou vítima quando, em 2012, homens armados invadiram a sua casa e apontaram uma arma à sua filha. O seu guarda-costas foi morto, mas Mukwege conseguiu fugir com a família para a Suécia e para a Bélgica. Em 2013, regressou à República Democrática do Congo depois de um grupo de mulheres, a viver com menos de um dólar por dia, se juntar para lhe comprar um bilhete de volta a casa.
Mukwege encontra-se presentemente a viver no Hospital Penzi, no qual exerce a função de diretor.
Raif Badawi - 2015, Arábia Saudita
RAIF BADAWI é um jovem bloguista saudita e um defensor da liberdade de pensamento e de expressão que foi preso e flagelado.
Fundou e dirigiu os fóruns em linha Saudi Liberals e, mais tarde, Free Saudi Liberal Network, onde, num país conservador, se podia debater temas religiosos e políticos. Os fóruns contavam com um milhar de utilizadores registados quando Raif Badawi foi detido durante um dia, em 2008, e interrogado por suspeita de apostasia, um crime punível com a pena de morte na Arábia Saudita. Posteriormente, foi objeto de uma proibição ilimitada de deixar o país, as suas contas bancárias foram congeladas e a família da sua mulher tentou impor o divórcio. Um imã radical emitiu uma fatwa contra o bloguista.
Corajosamente, Raif Badawi continuou a difundir os seus pontos de vista liberais moderados. Escreveu, nomeadamente, em defesa do direito à liberdade de pensamento e de expressão e apelou a uma sociedade aberta às opiniões dos outros. Numa sociedade árabe vacilante sob o jugo teocrático, escreveu Badawi, um livre-pensador só tem de exprimir uma opinião para fazer cair sobre si uma fatwa. Esta situação, receava o bloguista, levaria as mentes mais brilhantes a fugir do país. Uma voz do liberalismo na Arábia Saudita, Raif Badawi empenhou-se, através dos seus escritos em linha e nos meios de comunicação tradicionais, em esclarecer a sua comunidade e em vencer a ignorância, erodindo a intocabilidade do clero e promovendo o respeito pela liberdade de expressão, pelos direitos das mulheres, das minorias e das pessoas desfavorecidas na Arábia Saudita, como escreveu, na prisão em 2015, no prefácio de um livro com textos da sua autor ia, recuperados apesar do encerramento definitivo dos seus sítios web.
Raif Badawi foi detido em 2012 e enfrentou várias acusações, incluindo a de apostasia, embora nenhum tribunal se tenha pronunciado sobre este último aspeto. Foi declarado culpado da criação de um fórum onde circulavam comentários e posts em linha de caráter blasfemo. Condenado a sete anos de prisão e 600 chicotadas em 2013, recebeu no ano seguinte uma nova pena de1 000 chicotadas, dez anos de prisão e uma coima de um milhão de riais (226 000 euros). Em janeiro de 2015, foi chicoteado 50 vezes perante uma multidão em cânticos, defronte de uma mesquita em Jeddah, na que deveria ser a primeira aplicação de uma série de 1 000 chicotadas a realizar ao longo de vinte semanas. Os médicos que o examinaram após as primeiras chicotadas encontraram feridas tão profundas que concluíram que não sobreviveria a outra flagelação. Devido aos protestos internacionais e às preocupações sobre a sua saúde, foi suspensa, até ao momento, a realização de novas séries de chicotadas, mas a sentença do bloguista foi confirmada pelo Supremo Tribunal em junho de 2015. Está proibido de utilizar quaisquer meios de comunicação social e de se deslocar ao estrangeiro durante 10 anos após ser libertado da prisão.
Ensaf Haidar, mulher de Raif Badawi, e os seus três filhos vivem no Canadá, tendo fugido da Arábia Saudita em 2013 devido a ameaças de morte anónimas.
Na prisão, Raif Badawi encontrou junto dos seus companheiros encarcerados a compreensão do que é o sentimento de humanidade.
Nadia Murad e Lamiya Aji Bashar - 2016, Iraque
Nadia Murad Basee Taha e Lamiya Aji Bashar sobreviveram à escravatura sexual pelo Estado Islâmico (EI) e tornaram-se porta-vozes das mulheres vítimas da campanha de violência sexual do EI. São defensoras públicas da comunidade yazidi no Iraque, uma minoria religiosa que tem sido objeto de uma campanha de genocídio por militantes do EI.
Em 3 de agosto de 2014, o EI assassinou todos os homens da aldeia de Kocho, cidade natal de Lamiya Aji Bashar e Nadia Murad em Sinjar, no Iraque. Na sequência do massacre, as mulheres e as crianças foram escravizadas: todas as jovens, incluindo Lamiya Aji Bashar, Nadia Murad e as suas irmãs foram raptadas, compradas e vendidas várias vezes, e exploradas para fins de escravatura sexual. Durante o massacre de Kocho, Nadia Murad perdeu seis dos seus irmãos e a mãe, que foi morta juntamente com oitenta mulheres mais idosas consideradas como não tendo qualquer valor sexual. Lamiya Aji Bashar também foi explorada como escrava sexual, juntamente com as suas seis irmãs. Foi vendida cinco vezes entre os militantes e forçada a fabricar bombas e coletes suicidas em Mossul depois de os militantes do EI executarem os seus irmãos e o pai.
Em novembro de 2014, Nadia Murad conseguiu fugir com a ajuda de uma família vizinha, que a retirou clandestinamente da zona controlada pelo EI, permitindo-lhe seguir para um campo de refugiados no norte do Iraque e depois para a Alemanha. Um ano mais tarde, em dezembro de 2015, Nadia Murad dirigiu-se ao Conselho de Segurança das Nações Unidas na sua primeira sessão sobre tráfico de seres humanos com um discurso de grande impacto sobre a sua experiência. Em setembro de 2016, tornou-se a primeira embaixadora da Boa Vontade do UNODC para a Dignidade dos Sobreviventes do Tráfico de Seres Humanos, participando em iniciativas de sensibilização globais e locais sobre a difícil situação das inúmeras vítimas do tráfico de seres humanos. Em outubro de 2016, o Conselho da Europa homenageou-a com o Prémio dos Direitos Humanos Václav Havel.
Lamiya Aji Bashar tentou fugir várias vezes até escapar finalmente em abril, com a ajuda da sua família, que contratou passadores locais. Ao fugir da fronteira curda para território controlado pelo Governo do Iraque, com militantes do EI no seu encalço, uma mina terrestre explodiu, matando duas pessoas das suas relações e deixando-a ferida e quase cega. Felizmente, conseguiu escapar e acabou por ser enviada para tratamento médico na Alemanha, onde se juntou aos seus irmãos sobreviventes. Desde a sua recuperação, Lamiya Aji Bashar tem trabalhado ativamente na sensibilização para a difícil situação da comunidade yazidi e continua a ajudar mulheres e crianças que foram vítimas da escravatura e das atrocidades do EI.