Ciência. Quando as novas tecnologias testam os limites da lei

10 de Janeiro, 2017

Imagine que está num carro que se guia sozinho. Há um acidente. Mesmo que seja leve, esqueça a declaração amigável porque primeiro há que aferir de quem é a culpa. Será sua, sendo, neste caso, um mero passageiro? É do proprietário do veículo, que apenas o comprou? Ou será de quem fez o software e idealizou o veículo, do fabricante ou da empresa que suporta a ligação à internet?

O exemplo não é nosso – é de Carlos Coelho, deputado do Parlamento Europeu, que alertou na passada sexta-feira para a necessidade de as leis acompanharem a evolução estonteante das tecnologias. “E não falo de ficção científica”, lembrou o deputado.

De todo. Eles andam aí: lembre--se, por exemplo, dos self-driving cars da Google, que inauguraram esta tecnologia (ver caixas).

Estes veículos podem ainda não ser banais mas, segundo os peritos, serão uma das tendências das próximas décadas. Carlos Coelho escolheu este exemplo para abrir hostilidades perante uma plateia de peso, composta por mais de três dezenas de cientistas de excelência de diversas áreas. O motivo do encontro era simples: discutir o relatório “Antecipar o Futuro – 10 Tecnologias que podem mudar as nossas vidas”, realizado pelo STOA (Science and Technology Options Assessment), estrutura do Parlamento Europeu a que pertence.

“É muito importante legislar bem num domínio em que ainda estamos muito no início e é difícil ver o que será o futuro”, considerou Carlos Moedas, comissário europeu para a Investigação, Ciência e Inovação, presente no evento.

O comissário – que falou ao i à margem do debate – realçou ainda a importância destes debates multidisciplinares com cientistas para a tomada de decisão política.

E, na matéria jurídica, uma das preocupações praticamente unânimes a todos os cientistas presentes no debate – muitos, conceituados professores das melhores universidades do país – foi a problemática da proteção de dados, que cada vez mais pertencem a companhias privadas. Para além disso foram referidos outros impactos sociais relacionados, por exemplo, com a inteligência artificial, e qual será o papel desta na taxa e no tipo de emprego que teremos no futuro.

Proteção de dados

Muitas das empresas que detêm o monopólio dos nossos dados – que vamos deixando, tal e qual um rasto, na internet – estão sediadas num número muito baixo de países, havendo, por isso, uma concentração de informação sobre as nossas vidas que pode ser usada de forma tendenciosa e menos correta.

“Um dos pontos que tenho trabalhado muito é, efetivamente, a proteção de dados”, disse ao i Carlos Moedas. Segundo o comissário, estas questões são um dilema no qual é preciso pensar transversalmente, embora tenha escolhido um exemplo da área da saúde.

“Temo-nos debruçado sobre a questão se os cientistas têm o direito de usar dados na área da saúde para desenvolverem ou não curas para determinadas doenças”, continua. “Até porque, em muitos casos clínicos relevantes, já não se pode pedir autorização às pessoas porque já morreram.”

Por isso, durante a sua intervenção no debate, defendeu que as equipas de cientistas deveriam trabalhar diretamente os legisladores que poderiam assim “assentar as suas iniciativas numa base científica sólida”.

 

Dez tendências para mudar a sua vida

O relatório do STOA discutido na Reitoria apresentou dez exemplos práticos de novas tecnologias e de como podem mudar as nossas vidas. Os principais desafios legislativos que implicam, bem como os impactos sociais – previstos e imprevistos –, foram abordados para cada uma delas.

Ao lado, trazemos-lhe as dez tendências que a União Europeia acredita vão entrar, em força, no quotidiano dos cidadãos do Velho Continente.

 

 


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