Na sequência da polémica decisão do Tribunal de Justiça (acórdão de 13 de Setembro 2005, processo C-176703, Comissão contra Conselho) que conferiu à Comunidade poderes para sancionar criminalmente infracções graves ao direito do ambiente - retirando assim aos Estados membros o seu poder de veto em matéria penal - o Parlamento Europeu discutiu e votou um relatório da Comissão de Assuntos Jurídicos que analisa as consequências desse acórdão.
O Relatório Gargani acolhe a decisão do Tribunal de Justiça e apoia a intenção da Comissão Europeia de estender a competência penal a outras políticas comuns da União, que não apenas a do ambiente. A União ganharia assim uma competência de que actualmente não dispõe de modo geral. A competência penal da União Europeia circunscreve-se, com efeito, ao chamado "terceiro pilar", um domínio no qual os governos reunidos em Conselho de ministros decidem - por unanimidade e sem a intervenção do Parlamento Europeu - acções comuns no campo da criminalidade organizada, da luta contra o terrorismo e da cooperação policial.
A Deputada Assunção Esteves, que no Parlamento Europeu tem insistido na urgência de um direito penal europeu, disse na sua intervenção que "esta Europa cheia de ambições está ainda na pré-história do seu direito penal."
" Consensos vagos e avanços tímidos mostram como os Estados resistem ao futuro. Mostram a insuportável contradição de uma comunidade política que se afirma sobre valores fundamentais comuns, mas que deixa ao gosto de cada Estado precisamente o direito que garante esses valores."
"Ironia esta que o Tratado Constitucional tentou apagar e que o Tribunal intuiu na melhor das interpretações. "
"Enquanto as instituições políticas europeias disserem que o direito penal europeu assenta no simples princípio do reconhecimento mútuo, a Europa não conhecerá um projecto penal. Não terá um espaço de Liberdade, Segurança e Justiça em sentido verdadeiro e próprio."
"Porque a Europa é um projecto global de Justiça, não é um projecto de domínios preferenciais da justiça. "
Para a Deputada da Comissão de Assuntos Constitucionais, actualmente "o que a Europa mostra é a ausência de um espaço comum com um projecto comum no domínio penal, um mosaico retalhado de fronteiras."
Segundo Assunção Esteves, o que existe é uma "harmonização incoerente, de mínimos, sem obedecer a um programa político-criminal".
"Harmonização do limite mínimo das penas máximas - a mostrar a nossa falta de audácia. Harmonização aparente, apenas pela sanção - sem abranger os elementos do crime, as penas alternativas, as formas de execução."
"Uma Europa que proclama a dignidade de todos e os valores que a garantem, do Estado de Direito, da proporcionalidade e da igualdade, exige um programa de justiça penal. Mas o que mostra é um direito penal que absurdamente se separa dos valores que garante na estrutura de competências dos pilares. Um direito penal que se afirma quase só securitário, nas paredes do Conselho, sem uma partilha efectiva democrática dos Parlamentos. O que mostra é o reconhecimento mútuo de sistemas penais particulares sem uma base essencial de harmonização. Verdadeira chancela da iniquidade. É isso que não queremos e que a Europa mostra. Porque este domínio do direito penal é o domínio por excelência dos valores."
A terminar, a Deputada do PPE afirmou perante o Plenário: " Ficamos à espera do campo aberto do Tratado e antes, ainda, de uma vontade política forte que tarda em chegar."