Refugiados tarde e pouco

28 de Setembro, 2015

Para que não haja dúvidas, começo por deixar claro que estou contente por o Conselho de Ministros ter chegado a uma decisão sobre os refugiados. Confrontados com uma enorme tragédia humanitária, o mais grave seria nada decidir. Mas decidiu tarde e pouco!

1. Uma Decisão tardia

Já a dimensão do problema era evidente, a Itália e a Grécia estavam submergidas com refugiados, e o Conselho reunia e adiava mostrando incapacidade de decisão. A Comissão Europeia foi clara nas propostas e o Parlamento Europeu forte no apoio, mas o Conselho arrastou os pés lamentavelmente. Dava a ideia que a Europa não reage em situações de crise e que não tem vontade de ajudar quem mais precisa. Em Setembro de 2015, depois de pelo menos seis meses de emergência gravíssima, os Governos decidiram finalmente "satisfazer os pedidos de ajuda apresentados pelos Estados-Membros da Linha da Frente..."

2. Serão 120.000 mas não agora

Na aparência os Estados-Membros tomaram uma decisão: a recolocação de 120.000 mil pessoas, cujo ponto de entrada tivesse sido Itália ou Grécia. Mas lendo as letras miudinhas o aplauso terá de ser moderado. Não são 120.000 pessoas, mas 66.000. A Hungria, que de forma mais flagrante não tem cumprido com as suas obrigações, recusou beneficiar deste esforço. Os 54.000 que lhe estariam destinados poderão ser alvo de uma nova proposta da Comissão ou, dentro de um ano, reforçar a ajuda à Itália e à Grécia. Pelo menos 400.000 mil pessoas pediram asilo na Europa nos primeiros 6 meses do ano. Se nada for feito, é razoável sugerir que dentro de um ano teremos pelo menos mais um milhão. Ou seja, os 120.00 não são para já e sabem a pouco.

3. Tudo depende da boa vontade volúvel dos Estados-Membros

Na proposta que serviu de base a esta decisão, o número de refugiados a acolher por cada Estado-Membro foi definido com base num conjunto de critérios (PIB, desemprego, população, entre outros). No fundo, lançando as bases para um futuro mecanismo permanente, com quotas obrigatórias a activar pela Comissão Europeia. Mas novamente decidiu-se adiar o problema: rasgaram-se os critérios, tudo é voluntário e como cada um quiser. O Parlamento vai continuar a bater-se por um sistema claro e justo que possa ser accionado em situações de emergência, e não esteja dependente de mais Cimeiras, mais Conselhos, mais bloqueios e a contínua sensação de impotência europeia.

4. Provou-se que a Europa não está unida

O Conselho não foi capaz de ter uma resposta consensual e decidiu por maioria, já a Cimeira de Chefes de Estado e de Governo obteve a unanimidade... Mas apesar do reconhecimento de que "não podemos continuar como fizemos até aqui. Sem mudar o actual paradigma, o espaço Schengen apenas existirá em teoria", como foi afirmado pelo Presidente do Conselho Europeu Donald Tusk, a conclusão a que chegaram foi a de que em Outubro haverá nova discussão...

5. O dinheiro não resolve tudo mas tem de aparecer.

Os Governos pediram o reforço do financiamento do Programa Alimentar Mundial (do ACNUR), do Fundo de resposta à crise síria e do Fundo de apoio a África. É verdade que não devemos alimentar a ideia de que o fluxo migratório terminará se apenas atirarmos dinheiro para os campos de refugiados nas imediações da União Europeia. A solução sustentável do problema passa por assegurar que ninguém tem de abandonar o seu país para fugir à guerra e à perseguição. Mas algum dinheiro será necessário e o Conselho é useiro e vezeiro em soluções engenhosas de criatividade orçamental: buscando dinheiro a rubricas de onde ele não pode sair ou antecipando créditos que irão faltar mais tarde. O Conselho terá de provar que, desta vez, é sério e vai reforçar realmente o orçamento comunitário.

 


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