- todos os apoios à exportação fossem reduzidos (e não só as 'restituições');
- se consagrasse o princípio da 'multifuncionalidade' da agricultura, resultante das outras funções que presta à sociedade para além da produção (preservação do ambiente e da paisagem, evitar a desertificação de certas partes do território, etc.);
- se assegurasse um melhor equilíbrio entre os aspectos comerciais e não comerciais da agricultura, consagrando designadamente a protecção às denominações de origem e o direito a medidas excepcionais de protecção do mercado sempre que estivessem em causa suspeitas fundamentadas de perigos para a saúde pública ou ambiental da comercialização e consumo de certos produtos".
Arlindo Cunha, no debate no Plenário do Parlamento Europeu, salientou que, em contraste, "os principais concorrentes da União Europeia, designadamente os Estados Unidos e o Grupo de Cairns (Grupo de 13 países grandes exportadores de produtos agro-alimentares, que inclui designadamente a Austrália, a Nova Zelândia, o Canadá, o Brasil, a Argentina e a Indonésia) para quem a OMC é, simplesmente, igual a mais comércio, pretendem exclusivamente aumentar o acesso aos mercados e reduzir tudo o que possa relacionar-se com protecção da agricultura. Para estes países a agricultura e o comércio agrícola têm de ser tratados como qualquer outro sector da economia, o que implicaria o fim da excepção agrícola.
Por seu lado, o grupo dos países em desenvolvimento pretendem que o próximo acordo de comércio corresponda à oportunidade que nunca tiveram em mais de 50 anos de multilateralismo comercial. Apesar de ser um grupo muito heterogéneo, as suas principais reivindicações têm a ver com um tratamento assimétrico e diferenciado, assim como a protecção do mercado interno para permitir o desenvolvimento da produção interna em produções de grande consumo local. Ou seja, a lógica de segurança alimentar".
Fazendo o balanço das negociações de Doha, Arlindo Cunha afirmou que "é cedo para dizer quem vai ganhar ou perder, pois em Doha apenas estava em causa o acordo sobre uma agenda programática e um calendário.
Os grandes vencedores foram claramente os países em desenvolvimento, cujas pretensões foram integralmente consideradas no texto, incluindo os Países ACP, que estão entre os mais pobres do mundo, e que viram reconhecido o princípio da consolidação das preferências acordadas pela UE no Acordo de Cottonou.
Os restantes ficaram-se, para já, pelo empate.
Os países do Grupo de Cairns viram ficar no texto consagrado o princípio da continuação das reformas agrícolas, da melhoria do acesso ao mercado e a eliminação progressiva das restituições às exportações.
A União Europeia conseguiu que essa diminuição dos subsídios às exportações não fosse automática, e viu consagradas algumas das suas principais reclamações em matéria de reforço das componentes não comerciais, como foi o caso da referência às regras ambientais, à etiquetagem ou em geral ao princípio de precaução".
Para Arlindo Cunha, "Doha foi um ponto de partida. Apesar dos três anos indicados como data para concluir as negociações, ninguém acredita nessa rapidez, especialmente se tivermos em conta que o actual acordo (a ronda do Uruguai) demorou oito anos a negociar.
Apesar do relativo optimismo dos negociadores comunitários, o acordo não consagrou algumas das nossas pretensões fundamentais. A multifuncionalidade não ficou expressamente referida no texto, e o reforço das medidas de protecção das indicações geográficas só, foi explicitado para o caso concreto dos vinhos".
Arlindo Cunha alerta ainda para uma conclusão que classifica de "claríssima: a eliminação, ainda que a prazo, das restituições à exportação, vai criar pressões fortíssimas para a redução interna dos preços agrícolas. E assim sendo, não é difícil de concluir que a próxima reforma da PAC (necessariamente antes de 2006, conforme o Acordo de Berlim de 1999) terá de ser substancialmente mais profunda do que se poderia esperar. Não apenas pela redução dos preços de garantia que irá implicar, mas especialmente pela alteração qualitativa dos instrumentos de apoio aos agricultores, por forma a que, mesmo sem apoios de mercado, continuem a ter uma rede de segurança de rendimento.
E que não haja ilusões, acrescenta. Hoje a luta dos nossos adversários comerciais é pelo fim dos apoios que supostamente mais distorcem a concorrência internacional. Mas amanhã quererão impor o fim de todo o tipo de subsídios à agricultura. Ou seja, a velha história dos anéis, dos dedos e … do resto".