Dia da Europa 2006 - Discurso do Presidente da República
Discurso do
Presidente da República no Seminário Dia da Europa 2006
Centro Cultural de Belém, Lisboa
Nunca como hoje foi tão importante
debater a Europa. Num mundo em mudança rápida, com novos desafios
a desenharem-se, com os velhos paradigmas económico-sociais a serem
questionados, o debate sobre a construção europeia é um
imperativo inadiável para os europeus e, em particular, para os
portugueses. Um debate que questione, que aprofunde, que estimule, que
responda. Um debate que permita escorar as opções
responsáveis para o futuro da integração europeia. A
Europa não se construirá com base na inércia ou na
ignorância. Tão pouco se poderá consolidar na
desconfiança ou no medo.
No quadro das minhas responsabilidades e competências empenhar-me-ei em
apoiar a reflexão e o debate sobre a integração europeia,
na convicção que tenho de que o futuro da Europa é
decisivo para o nosso devir colectivo. Os desafios europeus são
também os nossos desafios!
E é, por isso, que participo com empenho na abertura desta
conferência a propósito do Dia da Europa que amanhã se
celebra.
Quero saudar desde já o Instituto de Estudos Estratégicos
Internacionais e o Jornal Público que, desde 1995, organizam esta
meritória iniciativa. Saúdo também a Comissão
Europeia e o Parlamento Europeu, instituições que apoiam a
realização desta Conferência. Saúdo, ainda, todos os
participantes, em particular o Presidente da Comissão Europeia.
Nunca será demais celebrar o génio dos fundadores do processo de
integração europeia. A Declaração Schuman ainda ecoa hoje, projectada num admirável
projecto de cooperação e de solidariedade que garantiu a paz e a
prosperidade na Europa como nunca antes ocorrera.
De uma União Aduaneira passou-se a um Mercado Comum e depois à
União Económica e Monetária, com a moeda única a
constituir um marco de referência da integração. De uma
Comunidade Económica Europeia de seis Estados passou-se a uma
União Europeia de 25 membros, em breve 27, num processo que constitui
testemunho inequívoco da atracção que exerce o sucesso do
processo de integração europeia. De uma Europa dividida passou-se
à criação de um espaço sem fronteiras, que respeita
as diversas identidades nacionais. Tirar partido das sinergias da escala
europeia sem destruir o valor das diferenças, é essa a
originalidade e o desafio maior do processo de integração europeia.
Em 1 de Janeiro de 1986, Portugal tornou-se Estado membro das Comunidades
Europeias, assumindo em pleno o seu papel de parceiro empenhado e activo na
construção europeia. Vinte anos depois, posso dizer, com
convicção, que valeu a pena. Valeu a pena duplamente: desde logo
porque Portugal tem beneficiado intensamente da adesão, mas
também porque tem contribuído consistentemente para o processo de
integração.
O nosso País não se limitou a colher os legítimos
benefícios que a adesão lhe proporcionou. Portugal adicionou
valor ao projecto europeu, partilhando a sua identidade secular e a sua
visão do mundo e cooperando solidariamente com as
instituições europeias e os seus parceiros.
Quando aderimos, há vinte anos, o maior desafio a vencer era
precisamente o da credibilidade. Sabíamos que a Europa ainda olhava para
Portugal com alguma desconfiança, às vezes mesclada de algum
paternalismo distante. Portugal tinha vivido um período de intensa
instabilidade política e a economia portuguesa sofrera
consideráveis oscilações de desempenho.
Quando aderimos em 1986, a questão que estava latente no espírito
dos nossos parceiros era se Portugal seria capaz de suportar o impacto de
adesão e de participar em pleno nas políticas europeias. A
resposta a essa questão foi exemplarmente dada pelos resultados destas
duas décadas de integração. Superámos o teste da
credibilidade. Quando Jacques Delors
designou Portugal como “o bom aluno”, numa expressão feliz,
mas não raro mal interpretada por alguns, quis justamente evidenciar que
o nosso País tinha sabido ultrapassar as desconfianças e era
considerado unanimemente como um parceiro sério, estável,
solidário.
Essa credibilidade conquistada, pois foi de conquista que se tratou, fundou-se,
em primeiro lugar, no desempenho interno do País, seja pelo eficaz e
estável funcionamento das instituições democráticas
e da Administração, seja pela recuperação da
economia. Fundou-se também na capacidade para aceder aos fundos
estruturais, usando-os de uma forma intensa para alcançar o progresso
económico e social do País.
Mas a credibilidade alcançou-se também a partir da nossa
participação efectiva nas instituições
comunitárias. Cultivando o rigor, o espírito de cooperação
e a solidariedade, Portugal soube granjear crédito junto dos seus
parceiros. Essa credibilidade foi decisiva para poder defender com
eficácia os nossos interesses específicos.
O modo como exercemos as duas presidências do Conselho da União
Europeia, em 1992 e em 2000, fortaleceu o nosso capital de
afirmação. Em 1992, nesta mesma sala onde hoje estamos, presidi,
então na qualidade de Primeiro-Ministro, ao Conselho Europeu de Lisboa. Aqui
se decidiu a criação do Fundo de Coesão, as principais
orientações para o que viria a ser o Pacote Delors
II e as grandes linhas estratégicas para o futuro alargamento da
União Europeia. Recordo grandes protagonistas desse Conselho, como François Mitterrand,
entretanto já desaparecido, Helmut Khol e Filipe Gonzalez, actores
decisivos de uma década de aceleração do processo de
integração europeia. Em 2000, na presidência portuguesa,
com o Primeiro-Ministro António Guterres, foi estabelecida a
Estratégia de Lisboa que continua a ser o quadro de referência
para o grande objectivo de colocar a Europa no topo da competitividade mundial.
Ao longo destes anos, Portugal conseguiu assegurar um lugar na linha da frente
da construção europeia. Portugal aderiu justamente no momento em
que a integração europeia conheceu uma aceleração
ímpar na sua história, o que impôs ao nosso País,
não apenas a exigência de se adaptar ao acervo comunitário
existente à data da adesão, mas também a capacidade de acompanhar
o ritmo das intensas mudanças que se foram produzindo.
Com o Acto Único Europeu lançou-se o mercado único de par
com o princípio da coesão económica e social. Este
último é, e tem de continuar a ser, um pilar fundamental da
integração europeia, não só pelo seu valor
intrínseco, mas porque foi criado para dar resposta às dificuldades
dos Estados menos apetrechados para retirar todas as vantagens que o mercado
único oferecia e oferece.
Com os Acordos de Schengen, sete países da
União Europeia anteciparam a livre circulação de pessoas,
realizando em pleno o espaço sem fronteiras concebido no Acto
Único Europeu. Por seu turno, o Tratado da União Europeia
estabeleceu uma União Monetária que está já
concretizada.
Ora, Portugal levou por diante o mercado único, fez parte do primeiro
grupo de países Schengen e integrou a moeda
única desde o princípio, superando desconfianças e
resistências vindas de vários lados. Ou seja: acompanhou
plenamente o exigente processo de aprofundamento da integração,
revelando não só vontade política, mas também
efectiva capacidade reformista para se adaptar ás mudanças. Esse
desempenho português colocou-nos no centro do processo de
construção europeu.
Entretanto, a União Europeia passou de 12 para 25 Estados membros.
Portugal foi dos países mais atingidos pelo impacto do quinto
alargamento, como vários estudos identificaram, o que, todavia, nem
sempre foi devidamente entendido e ponderado pelas instâncias
comunitárias. Mas também quanto aos alargamentos da União
Europeia a orientação portuguesa sempre se pautou por uma atitude
responsável, coerente e solidária.
No balanço destes vinte anos de integração não pode
deixar de relevar-se o impacto
económico-social. Este período foi dos mais fecundos da nossa
história e marcou uma convergência real com a Europa acima das
expectativas. O fraco desempenho da economia portuguesa registado nos anos mais
recentes não apaga os progressos alcançados nestas duas
décadas.
Quando aderimos, o nosso Produto per capita
situava-se à volta de 53% da média comunitária; quinze
anos depois estávamos mais de vinte pontos percentuais acima, ou seja
perto de 75%, significando um ritmo de convergência real que só
foi superado pela Irlanda. Hoje, o Produto per capita
recuou para cerca de 70%, após alguns anos de quase
estagnação económica e de divergência real com a UE,
sendo precisamente um dos grandes imperativos nacionais a retoma da
convergência real, para atingir a média da União Europeia o
mais rapidamente possível.
Todas as análises produzidas por instâncias credíveis
internacionais concluem do mesmo modo: a integração de Portugal
na União Europeia foi o mais importante factor de crescimento
económico e de melhoria da qualidade de vida dos portugueses nos
últimos vinte anos. Porque fez convergir três elementos decisivos:
a modernização do quadro legal e administrativo, favorecendo uma
economia aberta e competitiva; o acesso aos fundos comunitários e a
atracção do investimento directo estrangeiro.
Há tendência para subestimar o impacto da adesão, para
além dos fluxos financeiros. Ora esse impacto também foi muito
positivo. Atacaram-se os vícios administrativos do proteccionismo,
abriu-se a economia à iniciativa e estimulou-se a procura de
eficiência e de elevados padrões de qualidade.
Ou seja, favoreceu-se o marco competitivo e consolidou-se um modelo
económico e social compatível com as democracias ocidentais.
É uma evidência que os fundos estruturais impulsionaram a economia
portuguesa. Uma parte significativa do crescimento económico pode ser
imputada aos apoios comunitários executados nos três quadros
comunitários de apoio decorrentes dos Pacotes Delors
I e II, e da Agenda 2000.
Poderá sempre polemizar-se à volta das opções de
aplicação dos fundos comunitários, é certo. Mas
é também certo que esses fundos induziram um benefício
considerável no que se refere ao desenvolvimento económico e
social do nosso País. É verdade que há ainda muito por
fazer. Mas importa reconhecer que, sem os fundos comunitários, teria
sido impossível modernizar as infraestruturas
de comunicação e sociais que hoje cobrem praticamente o
País.
Aos fundos da União Europeia associou-se o investimento directo
estrangeiro, que quintuplicou, só nos primeiros cinco anos após a
adesão. Também aí a modernização das nossas infraestruturas, bem como a melhoria da qualidade e da
intensidade da formação profissional, foram factores
determinantes na atracção de investimento do exterior. Investimento
que trouxe tecnologia, mercado, organização e
criação de emprego.
É neste contexto que importa sublinhar um outro impacto da
adesão: as relações com a Espanha. Em 1986 descobrimos
novas dimensões na relação com o país vizinho. Já
não apenas o competidor, às vezes exacerbado por um passado de
antagonismos, mas acima de tudo o parceiro da União Europeia. E
descobrimos o mercado de grande potencial. E as sinergias de proximidade
traduzidas em comércio, em investimento, em serviços, em
concertação regional, mas também em intercâmbio
cultural que atingiu níveis nunca atingidos.
E se é verdade que os dois países nem sempre têm, nem
têm de ter, uma simétrica convergência de interesses e de
orientação, não é menos verdade que, na
generalidade dos temas europeus, há uma convergência que deve ser
cultivada. A intensidade das relações luso-espanholas não
pode senão reforçar-se no contexto da integração
europeia.
Um olhar sobre estes vinte anos traz também ao de cima uma outra
consequência da nossa participação na União
Europeia: o reforço da nossa voz na cena internacional. Ao
contrário do que alguns anteciparam, Portugal incrementou, com a
adesão, os laços com os seus parceiros tradicionais extra-europeus, nomeadamente com os países da lusofonia, mas também, por exemplo, com os
países mediterrânicos. A causa de Timor-Leste que saiu vitoriosa
com o reconhecimento da independência, embora em contexto de
dramático sofrimento, beneficiou do nosso estatuto de Estado membro da
União Europeia, quando tivemos que defender essa
orientação nas instâncias internacionais. A nossa
capacidade de interagir com os Países Africanos de Língua Oficial
Portuguesa, nomeadamente nas áreas da cooperação, saiu
também reforçada, e a nossa participação na
União Europeia permitiu àqueles nossos parceiros um acesso mais
facilitado a meios e recursos.
Noutro prisma, Portugal contribuiu muito activamente, ao longo destes vinte
anos, para o reforço das relações da União Europeia
com outros países e regiões, designadamente aquelas com quem
temos laços privilegiados. É bem ilustrativo que tenha tido lugar
em Guimarães, sob presidência portuguesa, e perante o cepticismo
de muitos, o primeiro encontro União Europeia — Mercosul. Ou que tenha sido sob Presidência
portuguesa que se tenha institucionalizado o diálogo da União
Europeia com a Índia.
Para o sucesso que tem sido a integração de Portugal na
União Europeia há ainda dois factores que devo destacar.
Em primeiro lugar, o facto de ter sido possível cultivar uma ampla
convergência estratégica em torno da nossa
participação na União Europeia, por parte das principais
forças políticas e dos parceiros económicos e sociais,
convergência também revelada na cooperação entre
órgãos de soberania. Essa convergência constituiu uma
força para a negociação permanente de que é feita a
integração europeia.
Em segundo lugar, a qualidade dos portugueses que integram as instâncias
comunitárias e dos nossos representantes nos diversos órgãos
que compõem a constelação institucional da União
Europeia. O seu desempenho contribuiu muito para o prestígio do nosso
País e para a credibilidade granjeada nestas duas décadas. É
mais do que justo manifestar esse reconhecimento agora que se completam duas
décadas de integração de Portugal nas Comunidades
Europeias.
Não posso, também, deixar de referir a importância muito
particular das responsabilidades que foram atribuídas ao Dr. José
Manuel Durão Barroso, as quais, devendo-se, acima de tudo, aos seus
méritos e às suas qualificações, traduzem
igualmente o reconhecimento pelo percurso de Portugal na
construção europeia.
Minhas Senhoras e meus Senhores,
Entendo que o desafio da integração é um desafio
permanente, nunca definitivamente vencido. Portugal estará sempre
debaixo de um apertado escrutínio europeu, quer quanto à
situação das suas finanças públicas, quer quanto ao
desempenho da sua economia, quer ainda quanto à sua prestação
nas instituições europeias.
A preparação do Quadro de Referência Estratégico
Nacional para o período 2007- 2013 é um
novo desafio, oportunidade maior e decisiva para recolocar a economia
portuguesa no caminho da convergência real e dotá-la dos meios
para enfrentar a globalização.
O exercício da presidência do Conselho, no segundo semestre de
2007, é outro desafio que requer preparação atempada,
até pela exigente agenda que teremos pela frente.
A participação activa no debate sobre o modelo da
construção europeia é outra exigência que enfrenta o
nosso país. Portugal deve ter uma voz consistente e coerente na defesa
dos seus interesses fundamentais nas negociações sobre o futuro
da União Europeia.
Acredito firmemente que, com o esforço e empenho de todos, saberemos,
como no passado, fazer frente aos desafios e tirar partido das oportunidades
que a integração europeia continua a oferecer-nos.
O processo da construção europeia volta a enfrentar
difíceis e complexos desafios.
Declara-se frequentemente que a Europa está em crise. O fracasso do
projecto de Tratado Constitucional, em dois países que o submeteram a
referendo, agudizou dramaticamente aquela percepção, sobretudo
evidenciada pela reacção desapontada daqueles que consideram ser
o reforço da dimensão política uma condição
necessária para a sustentabilidade do processo de
integração europeia num mundo global. Alguns falam mesmo da
fadiga do processo de construção europeia.
Sem a querer negar, a crise actual não é provavelmente mais grave
do que outras que foram superadas pela integração europeia ao
longo dos seus mais de cinquenta anos de história.
A verdade é que muito daquilo a que chamamos hoje sintomas da crise
são, em grande medida, o resultado de um enorme sucesso: se é
preciso encontrar formas mais eficientes de gerir uma União alargada,
é porque a União Europeia é um êxito de cujas
vantagens outros querem usufruir, em nome da paz, da estabilidade e do
progresso social e económico; se os nossos povos são hoje mais
exigentes e pedem à Europa o que antes esperavam dos Estados, é
porque a Europa soube dar respostas a muitos dos seus anseios e os
cidadãos não admitem agora que ela falhe.
A verdade é que a integração europeia não é
a causa das dificuldades, mas antes a resposta aos problemas. A verdade
é que as questões sensíveis que os cidadãos
europeus hoje enfrentam, como o desemprego, a segurança e a
competição internacional, não sugerem menos Europa. Pelo
contrário, recomendam mais integração europeia.
Mesmo sem Tratado Constitucional há condições para
aprofundar a construção europeia e decidir, no curto prazo,
políticas e medidas que respondam às legítimas
expectativas dos cidadãos da Europa. Cidadãos que parecem
perplexos face às consequências da globalização e
mesmo quanto ao papel da Europa. E é aqui que é maior a
responsabilidade dos líderes europeus, para apontar o rumo e tomar as
decisões certas que recuperem a confiança dos Estados e dos
cidadãos.
Cito, por me parecer de uma inquestionável actualidade, o
tríptico com que Jacques Delors
definiu, há alguns anos atrás, o quadro de acção da
União Europeia: “a competição que estimula, a
cooperação que reforça, a solidariedade que une”. Eis
o que é necessário manter como referência: um quadro
competitivo e eficiente, uma cooperação reforçada e uma
solidariedade tangível e sem retórica.
Que não haja ilusões: não será possível
convencer os cidadãos europeus sobre o bem fundado de qualquer
reflexão teórica sobre o futuro da União Europeia se
não formos capazes, simultaneamente, de responder aos seus anseios mais
imediatos, se não lhes provarmos, pela nossa acção, que a
Europa constitui uma mais valia, face à capacidade de resposta dos
Estados.
Aprofundar a União Económica para equilibrar a União
Monetária, garantindo os objectivos de crescimento e de
criação de emprego, é algo que pode e deve avançar,
mesmo sem Constituição. De igual modo, o reforço da
Estratégia de Lisboa parece indispensável para poder colher os
resultados que se esperam e que tardam. A execução da
Estratégia de Lisboa deve impor uma disciplina e uma responsabilidade
partilhada por todos os Estados membros, sem o que acabaria por ser apenas um
mapa de boas intenções.
Onde há um interesse comum bem identificado, deve haver
acção da União Europeia. Sempre, como é
óbvio, respeitando os princípios da subsidiariedade e da
proporcionalidade. Um bom exemplo foi dado pela recente iniciativa da
Comissão Europeia sobre a energia. Trata-se claramente de um interesse
comum e, por isso, como lhe compete, a Comissão tomou a iniciativa. O
sector energético é decisivo para a competitividade e para a segurança
da Europa. E é decisivo também para as relações
externas da União Europeia com alguns dos seus vizinhos, como é o
caso da Rússia.
O Acordo Interinstitucional agora alcançado sobre o orçamento da
União Europeia para o período 2007-2013 foi uma boa notícia
para a Europa. Mas serei claro ao afirmar que se ficou aquém dos meios
necessários para enfrentar, com eficácia, os desafios e as
exigências da UE, nomeadamente os que decorrem dos alargamentos. Persiste
uma preocupante divergência entre as ambições definidas e
os meios alocados à União Europeia.
O ênfase posto pela Comissão Europeia no empreendedorismo e na inovação aponta na
direcção certa. Portugal deve saber cultivar a iniciativa
empreendedora que tem permanecido muito tímida e promover a inovação
como factor competitivo principal da sustentabilidade empresarial.
Permanece, contudo, uma questão central: é ou não
necessário reforçar a dimensão política da
União Europeia? A minha resposta é convictamente afirmativa. Sem
reforçar a sua dimensão política, sem tornar mais
eficiente o seu processo de decisão, sem garantir a coerência da
sua embrionária política externa comum, sem promover de forma
mais tangível a cidadania europeia, sem reforçar a sua
legitimidade democrática, a União Europeia enfrentará
sérias dificuldades para sustentar a União Económica e
Monetária, para conquistar o seu lugar como actor influente no mundo
global emergente e para realizar com sucesso os alargamentos.
As vicissitudes por que vem passando o processo de aprovação do actual
projecto de Tratado Constitucional são conhecidas. Nem por isso é
menos urgente a reflexão e o debate sobre esse tema. As reformas
comunitárias terão de ocorrer face aos desafios que a Europa
enfrenta. E é necessário que Portugal esteja preparado para ter
voz na negociação e na concretização dessas
indispensáveis reformas.
O princípio da igualdade dos Estados tem de ser, em qualquer caso,
assegurado e a maior agilidade do processo de decisão não pode
ser alcançada a expensas da legitimidade democrática e da
representatividade dos Estados.
No equilíbrio institucional que o modelo europeu traduz,
equilíbrio tão habilmente concebido pelos fundadores, há
que preservar o papel central da Comissão Europeia, nomeadamente
através do direito exclusivo de iniciativa em domínios de
competência comunitária. O enfraquecimento desta
instituição — aqui ou além tentado através de
iniciativas explícitas ou subreptícias
— não é do interesse da Europa, nem é seguramente do
interesse de Portugal.
Sempre que identificado um interesse comum é o método
comunitário que deve ser seguido para decidir as políticas e/ou
as acções necessárias. Alguma deriva intergovernamentalista
que vai emergindo é também lesiva do interesse comum europeu e
não serve os interesses de um País como Portugal.
A globalização está em curso e projecta-se cada vez com
mais pujança. Não espera pela Europa. E, todavia, o mundo global
precisa de uma Europa forte, coesa, influente.
Fechada sobre si própria, amedrontada, dividida e proteccionista, a União
Europeia falhará o encontro com o futuro e poderá até
tornar reversível o admirável percurso de
integração realizado até hoje.
Confio na capacidade dos europeus para levar por diante o indispensável
aprofundamento da integração, com a visão e a
ambição estratégicas que o mundo global requer. E confio
que Portugal saberá valorizar o seu lugar no futuro da
construção europeia.
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