O Tratado de Lisboa não morreu !

19 de Junho, 2008

1. POUCOS DECIDEM POR MUITOS

 

Algumas opiniões têm sublinhado que o voto da Irlanda é injusto porque poucos decidem por muitos (uma diferença de 100.000 votos — 800.000 para 700.000 — decidem por 500 milhões).

 

Aritmeticamente é verdade mas são as regras.  Todos os Estados-Membros têm de concordar para que o Tratado entre em vigor e cada Estado-Membro é soberano para decidir como o fazer: se por decisão parlamentar, se por processo referendário.

 

Se no que se refere aos Tratados a exigência da unanimidade é compreendida, é indiscutível que existe um excessivo leque de matérias em que manter a unanimidade conduz à situação de uns poucos poderem impedir a expressão da vontade de muitos.  Exactamente por isso, um dos objectivos do Tratado de Lisboa é reduzir significativamente o número de casos em que a unanimidade é requerida.

 

2. NÃO SEI O QUE VOTO

 

Preocupante é a razão que levou os eleitores irlandeses a recusar o Tratado.  Segundo todas as sondagens publicadas pelo Irish Times durante a campanha e após o resultado, quando perguntados porque votaram dessa maneira, os eleitores do "Não" responderam sobretudo "Não sei do que trata, na dúvida votei NÃO".

 

Temos de reconhecer que algo vai mal nas políticas de comunicação e informação.  O Grupo Europeu do PSD foi o único Grupo português a publicar uma Brochura com 33 Perguntas e Respostas (que também está online na Internet em www.psdeuropa.org/tratadolisboa) e um Jornal Pedagógico distribuído abundantemente em todo o País.

 

Diversas escolas e associações pediram ao PSD o envio destas publicações porque nenhuma instituição pública fez o que nós fizemos.  Se o nível de informação na Irlanda foi idêntico ao de Portugal, percebemos melhor um resultado mais ditado pelo desconhecimento do que pela recusa do que se propôs.

 

3. OUVIR TODOS

 

Não têm razão os que sustentam que os resultados do Referendo na Irlanda deve paralisar de imediato os procedimentos de ratificação.

 

Neste processo, todos devem expressar-se.  Nenhum Estado-Membro deve ser silenciado.  Ouvimos com respeito a decisão da Irlanda que resultou do Referendo.  Ouvimos já a vontade de 18 Estados-Membros que ratificaram o Tratado.  Devemos agora ouvir, com igual respeito, os 8 que ainda não se pronunciaram.

 

4. TUDO ESTÁ AINDA EM ABERTO

 

Antes de se ouvir os 8 Estados-Membros que ainda não tomaram qualquer decisão, ninguém pode antecipar o que vai acontecer.  Pode suceder que os 8 digam NÃO ao Tratado.  Pode suceder que se dividam.  E pode acontecer que todos digam SIM e o ratifiquem.

 

Se esta última situação se verificar, é razoável que se confronte a Irlanda com o facto de 26 Estados-Membros desejarem o Tratado e apenas um o recusar.  Não se trata de pedir para dar o dito por não dito.  Isso seria um exercício de hipocrisia desmerecedora da nossa Democracia.  Mas pode e deve pedir-se à Irlanda para identificar os artigos com que não concorda e negociar cláusulas de opt-out (cláusulas de não-aplicação) — como aliás o fizeram o Reino Unido e a Polónia, por exemplo — ou protocolos adicionais que garantam uma interpretação das normas aprovadas que não conflitue com aspectos que os eleitores irlandeses reputam de essenciais.

 

Esta pode ser uma saída sem que tenhamos de "enterrar" o Tratado de Lisboa e reabrir o processo, desperdiçando mais 7 anos em querelas institucionais em vez de nos concentrarmos nas questões que verdadeiramente preocupam os cidadãos europeus: Crescimento económico, criação de emprego, dependência energética, defesa do consumidor, saúde pública, segurança e justiça, mudanças climáticas, entre muitas outras.