O Pacote Telecom e a Emenda 138
6. A alteração original 138 era juridicamente viável?
Aparentemente, não...
Essa questão foi muito controversa mas parece pacífico que a versão original da emenda 138 ultrapassava as competências comunitárias.
A última versão da alteração 138 aprovada em 2ªleitura indica que no art. nº 8, §4, letra h "Aplicando o princípio segundo o qual, na falta de decisão judicial prévia, não pode ser imposta qualquer restrição aos direitos e liberdades fundamentais dos utilizadores finais, previstos, designadamente, no artigo 11.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia em matéria de liberdade de expressão e de informação, salvo quando esteja em causa a segurança pública e desde que possa seguir-se uma decisão judicial."(veja a Pergunta nº 2).
Desde o início do processo, o Conselho fez duras críticas políticas e jurídicas a esta alteração. Os principais argumentos jurídicos invocados podem ser agrupados nos seguintes pontos:
- Impondo uma “decisão judicial prévia” antes de qualquer restrição, a alteração 138 significa que nenhuma medida susceptível de limitar o acesso/uso da Internet pode ser tomada pelos Estados Membros, a não ser que um tribunal assim o tenha previamente ordenado. Na prática, era exigido aos Estados Membros para adaptarem a organização do sistema judicial nacional, de modo a reservar ao poder judicial a possibilidade de autorizar essas medidas restritivas. Baseado no princípio da subsidiariedade e na falta de competência do Parlamento Europeu, os Estados-Membros consideram que é da sua responsabilidade definir a sua própria arquitectura judicial;
- Enunciando uma regra geral a ser aplicada em todos os casos, a alteração 138 ignorava as novas realidades, tais como a criminalidade cibernética (pornografia infantil, etc.) para as quais alguns Estados Membros já aplicam processos acelerados, uma vez que os processos judiciais tradicionais não são sempre os mais adequados a este tipo de infracções;
- Focando a questão a nível de uma decisão judicial, a alteração 138 era incompatível com os princípios do direito dos contratos e a liberdade de prestação serviços. Com efeito, cada operador fica livre para estabelecer as suas condições contratuais, respeitando as leis nacionais e da mesma forma cada consumidor fica livre de escolher qualquer outro operador que ofereça condições contratuais mais favoráveis;
- Relembrando alguns princípios básicos na revisão do quadro Telecom, a alteração 138 estava somente a repetir parcialmente alguns dos direitos que estão já consagrados em textos mais importantes, tais como a Convenção Europeia dos Direitos e Liberdades fundamentais (direito a um processo equitativo no artigo 6º, recurso efectivo no artigo 13º, etc). Além disso, a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos confirmou em várias ocasiões que os direitos fundamentais e liberdades não exigem necessariamente que a instância de decisão seja um tribunal judicial;
- Colocando esta alteração 138 no artigo nº 8 da Directiva Quadro (objectivos de política geral e os princípios de regulação), ela confiava às autoridades nacionais reguladoras a função de guardiãs dos direitos e liberdades fundamentais dos utilizadores finais, para a qual não têm competências na área do reforço dos direitos fundamentais;
Perante tais críticas, a delegação do Parlamento Europeu no Comité de conciliação encarregou o serviço jurídico do Parlamento Europeu de avaliar a legalidade da alteração 138. O parecer apresentado em 12 de Outubro de 2009 confirmou que a alteração 138 ultrapassa as competências da Comunidade. Fundamentado na base legal da Directiva Quadro - artigo 95 do Tratado (harmonização do Mercado Interno), o Parlamento Europeu não pode exigir dos Estados-Membros uma “decisão judicial prévia”.
Para ler o parecer do serviço jurídico, carregue aqui