O Pacote Telecom e a Emenda 138



9. Será que o texto final é ainda melhor que a emenda 138?

Sim, sem sombra de dúvida…

O texto final do acordo prevê que :

« As medidas tomadas pelos Estados­Membros relativamente ao acesso ou à utilização de serviços e aplicações através de redes de comunicações electrónicas pelos utilizadores finais devem respeitar os direitos e as liberdades fundamentais das pessoas singulares, conforme garantidos pela Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais e pelos princípios gerais do direito comunitário.

Qualquer dessas medidas relativas ao acesso ou à utilização de serviços e aplicações através de redes de comunicações electrónicas pelos utilizadores finais, susceptível de restringir esses direitos ou liberdades fundamentais, só pode ser aplicada se for adequada, proporcional e necessária no contexto de uma sociedade democrática, devendo a sua execução ser sujeita a garantias processuais adequadas nos termos da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais e dos princípios gerais do direito comunitário, incluindo o da protecção jurisdicional efectiva e o do processo equitativo. Nestas circunstâncias, essas medidas só podem ser tomadas no devido respeito pelo princípio da presunção de inocência e pelo direito à privacidade. É garantido um procedimento prévio, justo e imparcial, incluindo o direito de audiência do(s) interessado(s), sem prejuízo da necessidade de prever condições e mecanismos processuais apropriados em casos de urgência devidamente justificados em conformidade com a Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais. É garantido o direito a uma fiscalização jurisdicional efectiva e atempada."

Na realidade este texto integra todos os princípios da emenda original mas consegue ainda reforçá-los, nomeadamente:

  • O texto acordado tem uma aplicação mais geral. Ao figurar no artigo 1° da directiva Quadro (âmbito e objectivos), assegura-se assim que o respeito dos direitos e liberdades fundamentais dos utilizadores passa a ser uma obrigação geral que se aplica a todo o quadro regulamentar das telecomunicações. Acresce ainda que ao figurar no artigo 1°, este texto obriga tanto a Comunidade como os seus Estados Membros. Na sua versão prévia, ao figurar no artigo 8°, a emenda 138 obrigava apenas os reguladores nacionais a promover os direitos fundamentais, sem que estes dispusessem de competências para o efeito;
  • O texto do acordo cria um direito para o utilizador já que " as medidas tomadas pelos Estados­Membros (…) devem respeitar os direitos e as liberdades fundamentais das pessoas singulares” quando a versão original da emenda referia apenas um principio relativo às restrições “aplicando o princípio segundo o qual, na falta de decisão judicial prévia, não pode ser imposta qualquer restrição”;
  • O texto do acordo integra no direito europeu das Telecom o respeito por todos os direitos e liberdades consagras pela CEDH subscrita por todos os Estados-Membros quando a emenda original 138 referia a Carta Europeia dos Direitos Fundamentais que não foi reconhecida pelos 27 Estados-Membros;
  • O texto acordado garante o respeito por qualquer um dos direitos da CEDH quando a emenda 138 referia apenas o artigo 11° da Carta Europeia (liberdade de expressão e informação);
  • O texto do acordo é muito mais protector ao assegurar que qualquer restrição deve submetida a garantias processuais em conformidade com a CEDH e os princípios gerais do direito comunitário, incluindo o direito a ser ouvido, a uma protecção jurídica e um processo justo no respeito da presunção de inocência. Uma das principais mais-valias deste texto foi reconhecer que a presunção de inocência se aplica não só em matéria criminal mas doravante passa aplicar-se também em casos de medidas restritivas impostas por um Estado-Membro (ou um operador em cumprimento da lei). Estas medidas restritivas devem ainda respeitar o direito a privacidade, assim como as exigências de um procedimento justo e imparcial, já que a autoridade competente deverá demonstrar a existência de uma infracção/crime antes de qualquer medida restritiva. Na sua versão anterior, a emenda 138 apenas impunha “uma decisão judicial prévia";
  • Qualquer derrogação a estas salvaguardas processuais é agora muito mais limitada. Estas restrições devem respeitar não só a CEDH, mas só podem ser adoptadas nos casos justificados de urgência (perigo para a segurança publica, defensa nacional, …) o que excluiu claramente os casos de carregamento de ficheiros ilegais (ex. músicas) que nenhum juiz poderia considerar como justificado por motivos de urgência para prescindir da aplicação destas salvaguardas processuais;
  • O texto do acordo é legal ao deixar aos Estados Membros a escolha da jurisdição e do procedimento a aplicar nestes casos, desde que seja em conformidade com os direitos e liberdades garantidos pela CEDH, quando na realidade a emenda 138 ultrapassava as competências da UE tal como tinha sido invocado pelo Conselho e confirmado pelo serviço jurídico do próprio Parlamento Europeu (veja a Pergunta nº 6).

Por isso, a emenda original 138 é mais débil do que o texto acordado em conciliação. Juridicamente válido, este último é mais detalhado, mais abrangente e protector dos direitos dos cidadãos europeus.

A directiva Quadro e as suas directivas específicas (acesso e autorização, Serviços universais e direitos dos utilizadores, privacidade de dados nas comunicações electrónicas e protecção dos consumidores)