Reproduzimos a seguir, na íntegra, a intervenção do Deputado Vasco da Graça Moura sobre Macau produzida, hoje em Estrasburgo, na Sessão Plenária do Parlamento Europeu:
"O Partido Popular Europeu afirmou repetidamente considerar de fundamental importância que o Conselho e a Comissão tomassem uma posição pública antes do dia 20 de Dezembro, data em que ocorrerá a transferência do território de Macau para a República Popular da China. Entendo por isso manifestar todo o meu apreço e aplauso pelas posições aqui tomadas pelos representantes da Presidência e da Comissão, associando-me também à homenagem prestada pelo comissário Patten à figura do Governador Rocha Vieira. A posição do PPE acabou por ser aceite pelas outras forças políticas. Consideramos pois essencial que este debate tenha lugar, aqui e neste momento, por feliz coincidência no dia em que uma delegação do parlamento chinês nos visita.
A intervenção do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão contribuirá não somente para acautelar com mais solidez um conjunto de interesses que foram oportunamente especificados, mas ainda para reafirmar um autêntico protagonismo da União Europeia, de modo a que a China não possa deixar de ver nela um interlocutor privilegiado numa geoestratégia ligada à paz, à construção da democracia, à salvaguarda dos direitos humanos, ao desenvolvimento, ao diálogo e à modernidade no plano da cena mundial.
Durante mais de quatro séculos e meio, a presença dos Portugueses em Macau foi quase sempre pacífica e foi quase sempre tão importante para Portugal e para a Europa como para a China. Por isso, o que vai acontecer a partir de agora com este caso singularíssimo deve implicar também a União Europeia em termos muito especiais.
Valerá assim a pena dar-se o devido relevo ao facto de Macau constituir o primeiro ponto de contacto permanente estabelecido pela Europa com o Extremo-Oriente desde meados do século XVI: isto é, Macau representa emblematicamente quase cinco séculos de convivência pacífica e de recíprocas vantagens num quadro das mais variadas actividades diplomáticas, culturais e mercantis, permitindo o contacto entre a civilização europeia e a civilização chinesa, o fomento e a protecção do comércio externo da China, e uma expressão significativa dos interesses europeus.
Tudo isso concorreu para a especificidade de Macau: da sua história, da sua tradição e das formas de cultura, mestiçagem e convivialidade que ali se processam há tanto tempo e que são um activo extraordinário para as novas modalidades de relacionamento entre a UE e a China.
E é por isso também que faz todo o sentido e é da maior oportunidade política a adopção de uma posição clara, capaz de exprimir as expectativas fundadas e o empenhamento dos povos da União, no tocante ao futuro da Região Administrativa Especial de Macau no contexto político da China e às relações da Europa com ambas, no que respeita à defesa e promoção dos direitos humanos, dos demais valores do estado de Direito e do quadro jurídico específico aplicável à Região por força do seu novo estatuto e do princípio "um país, dois sistemas".
E o mesmo se diga também quanto ao princípio da autonomia e aos actuais sistemas económico e social de Macau, bem como, num plano mais alargado, às relações da União Europeia com aquela área do Extremo-Oriente, uma vez que a experiência encerra virtualidades que podem ser de extraordinária relevância nessa parte do mundo.
No que se refere a estes aspectos e a todos os restantes, alguns dos quais envolvem mais especificamente o meu país, é de esperar que as conclusões deste debate contribuam relevantemente para se atingirem os fins enunciados.
Por outro lado, todavia, o propósito manifestado pela Comissão, e que também é de saudar, de elaborar relatórios anuais sobre as relações União Europeia-Macau, não deveria dispensar o Parlamento Europeu de prestar, ele próprio, a maior atenção ao assunto, muito em especial acompanhando regularmente a sua evolução a partir de 20 de Dezembro de 1999; estreitando a tal respeito a troca de informações e a cooperação inter-institucionais; criando o seu próprio grupo de contacto e interligação; analisando e debatendo os relatórios periódicos que lhe forem apresentados; apreciando enfim a evolução de todos os aspectos da conjuntura ligada a Macau na perspectiva das transformações das relações internacionais no Extremo-Oriente e às alterações que nessa zona se anunciam, sem esquecer as situações novas eventualmente implicadas pela entrada da China na OMC e pela evolução e/ou modificação qualitativa das suas relações com os Estados Unidos da América.
A proposta de resolução conjunta cujo projecto foi apresentado e cuja substância percorri muito rapidamente, se favoravelmente acolhida, poderá contribuír em medida significativa para a consecução de todos os objectivos que ficaram referidos."