Pacto de Estabilidade e Crescimento



14. A revisão do PEC

Depois de 3 anos de controvérsia e de críticas sobre o rigor da aplicação das suas disposições, o Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) foi alterado. O então Presidente da Comissão Europeia, Romano Prodi, chegou a afirmar que o PEC era um instrumento "estúpido".

Os diferentes intervenientes neste processo de revisão "arrumam-se" em 3 grupos:

  1. "os ortodoxos" que consideram que as regras do PEC não podem ser alteradas só porque alguns grandes Estados-membros não têm conseguido respeitar os seus critérios. Este grupo de Estados-Membros, liderado pelos Países-Baixos e pela Áustria pauta-se pelo rigor e a estabilidade orçamental. Contam com o apoio "pesado" do Banco Central Europeu;
  2. "os moderados" são chefiados pelo Luxemburgo e contam com o apoio da Comissão Europeia. Mostram-se favorável à revisão cirúrgica do texto do PEC, tornando a sua aplicação mais flexível, mas sem colocar a questão da sua eficácia.
  3. "os revisionistas" são liderados pelo motor franco-alemão. Já em 1997, estes dois Estados-Membros, apesar de violarem os critérios, conseguiram que o Conselho suspendesse a aplicação do PEC, abrindo um conflito com a Comissão Europeia. Estes países deparam-se com a necessidade de realizarem reformas estruturais profundas e impopulares (pensões, segurança social, sistema de desemprego, etc.), com custos financeiros e sociais importantes que agravam as contas públicas. Convém recordar que os principais defensores da criação do PEC foram precisamente a França e a Alemanha. A actual rigidez do PEC foi aliás uma imposição destes dois Estados-Membros que receavam que os pequenos Estados-Membros como Portugal entrassem na moeda única com as suas contas públicas descontroladas. O facto destes dois Estados-Membros terem eleições no próximo ano também não deverá ser alheio à posição de flexibilidade excessiva. A Itália e Portugal integram este grupo.

Após um debate de 6 meses, os Ministros das Finanças dos 25 Estados-Membros, reunidos em Bruxelas no ECOFIN (21.03.2005), alcançaram numa maratona negocial um acordo sobre a revisão do PEC, com base numa proposta de revisão apresentada pela Presidência Luxemburguesa da UE.

Este acordo foi transmitido ao Conselho Europeu, que reuniu os Chefes de Estado e de Governo dos 25 Estados-Membros da UE, nos dias 22/23 de Março de 2005.

Esta revisão do PEC visava tornar o PEC num instrumento mais flexível, mais racional. Optou-se por valorizar mais o "C" de crescimento do que o "E" de estabilidade, tendo em conta o período de recessão económica que a UE atravessa. O PEC ficou assim mais "político" e "menos tecnocrata".

As principais alterações assentam essencialmente no seguinte:

  • o prolongamento dos prazos concedidos aos Estados-Membros com défice superior aos 3% para corrigir a situação. De dois anos para voltarem a cumprir o critério do défice, os Estados-Membros dispõem agora de 4 anos em geral, ou eventualmente 5 anos mediante certas condições. Com um período tão grande para corrigir a situação, é legítimo pensar que as sanções previstas em caso de incumprimento terão uma aplicação limitadíssima.
  • o reforço dasmedidas de prevenção em caso de défice excessivo. Foram redefinidos objectivos mais precisos de médio prazo para atingir uma situação orçamental equilibrada. Os Estados-Membros comprometeram-se a apresentar uma consolidação orçamental anual de pelo menos 0.5% do PIB ao longo do ciclo económico, com maior esforço em caso de ciclo positivo e sem recorrer a medidas extraordinárias.
  • o fim da automaticidade das sanções que serão doravante aplicadas de acordo com a situação económica e financeira de cada Estado-Membro. Caso a derrapagem orçamental seja fruto de um crescimento negativo ou de um abrandamento económico, as sanções não se aplicam. Introduz-se assim uma certa flexibilidade que permite uma avaliação concreta dos casos com base nos respectivos ciclos económicos dos Estados-Membros. No entanto, ao introduzir uma margem de apreciação política sobre a situação orçamental de um Estado-Membro, incorre-se o risco de multiplicar os conflitos entre o Conselho da UE e a Comissão Europeia responsável pela análise dos défices e das medidas correctivas dos mesmos. Tal conflito já ocorreu em 2003 quando o Conselho da UE decidiu suspender a aplicação do PEC no caso dos défices da Alemanha e da França.
  • a introdução de um elenco exaustivo de circunstâncias atenuantes que permita aos Estados-membros justificarem o incumprimento dos critérios, nomeadamente os custos da unificação alemã, as despesas militares, os investimentos na investigação científica, as despesas ligadas às reformas das pensões, as ajudas aos países em vias de desenvolvimento e as contribuições ao orçamento comunitário. Com base nestas justificações, os Estados-Membros estão autorizados a apresentar um "défice excessivo temporário e próximo do valor de referência". O elenco desta lista de justificações para o incumprimento foi o ponto mais debatido, tendo em conta que cada Estado-Membro fazia questão de integrar as suas especificidades. A integração dos custos da reunificação alemã foi severamente criticada por alguns Estados-Membros. Por outro lado, os novos Estados-Membros da UE poderão assim entrar com mais facilidade na zona euro já que os critérios de adesão à moeda única ficam agora mais flexíveis.

O Banco Central Europeu (BCE) criticou frontalmente esta revisão do PEC por recear uma quebra na disciplina orçamental dos Estados-Membros.

Sem uma aplicação rigorosa e mecânica do PEC, Portugal fica com uma margem de manobra mais vasta para realizar as reformas estruturais de que o país padece. Acresce ainda que Portugal poderá temporariamente ultrapassar o limite dos 3% já as despesas afectas às áreas da inovação e da investigação ("o choque tecnológico") não são contabilizadas para efeito do cálculo do défice.