Jorge Moreira da Silva na apresentação, no Plenário do Parlamento Europeu dos seus relatórios sobre Comércio de Emissões e sobre o Programa Europeu para as Alterações Climáticas, sublinhou que "8 anos depois do Rio, 3 anos depois de Quioto, podemos afirmar, sem exagero, que o dossier das Alterações Climáticas vive hoje o seu momento mais crítico - o seu momento da verdade.
Em primeiro lugar, porque, no plano institucional, a COP6 procederá à redacção final do Protocolo de Quioto e iniciará a fase de ratificação do Protocolo de forma a que este possa entrar em vigor até à Conferência "RIO+10", que terá lugar em 2002.
Em segundo lugar, porque, no plano interno, por falta de aplicação de Políticas e Medidas - como a eficiência energética, a promoção das energias renováveis, a tributação sobre energia e sobre CO2 e o desenvolvimento de tecnologias mais limpas nos transportes e na industria - estamos a divergir e não a convergir com os compromissos de redução acordados em Quioto.
Os números, aliás, falam por si: de acordo com os dados da Agência Europeia do Ambiente, é mais provável que venha a ocorrer um aumento de 6% das emissões de gases com efeito de estufa na União Europeia, entre 1990 e 2010, do que a redução de 8%, estipulada em Quioto, para o período 2008-2012 relativamente aos níveis de 1990. O sector dos transportes, segundo o mesmo estudo, é o que desperta maior preocupação dado que se prevê que, naquele sector, as emissões de CO2 aumentem 39% até 2010 em relação a 1990.
Esta autêntica derrapagem não só nos afasta das nossas metas (com as óbvias implicações ambientais e económicas) como descredibiliza a posição internacional da União Europeia".
Face a este contexto, que classificou de "extraordinariamente exigente", Moreira da Silva "aplaudiu a iniciativa da Comissão Europeia de apresentar conjuntamente o Livro Verde sobre a implementação de um Sistema de Comércio de Emissões e a Comunicação sobre a criação de um Programa Europeu para as Alterações Climáticas.
É que, ainda que a substância das propostas mereça alguns reparos e algumas críticas, como se poderá ver a seguir, a verdade é esta iniciativa enviou dois sinais políticos insofismáveis: para fora, regenerou a capacidade de liderança da União Europeia; para dentro, fez a pedagogia do cumprimento" .
Livro Verde relativo à implementação de um Sistema de Comércio de Emissões de Gases com Efeito de Estufa na União Europeia:
Para Jorge Moreira da Silva "este Livro Verde iniciou o debate sobre a arquitectura de um futuro sistema de Comércio de Emissões na U.E.
Para o arranque do sistema, a Comissão definiu um núcleo-duro de premissas:
- o sistema deverá basear-se numa abordagem learning by doing;
- deverá ter inicio em 2005;
- será limitado numa primeira fase ao CO2 e às fontes pontuais de grande dimensão.
O comércio de emissões que, de acordo com Protocolo de Quioto, será aplicado pelas Partes do Anexo B a partir de 2008, baseia-se nos mecanismos do mercado e proporciona uma diminuição dos custos globais da redução de GEE".
Moreira da Silva defendeu que "a implementação de um sistema deste tipo, na União Europeia, já a partir de 2005, tem vantagens indesmentíveis:
1º- Permitirá uma aprendizagem prática e uma preparação económica dos sectores, das empresas e dos próprios Estados-membros para o arranque, em 2008, do comércio de emissões a nível internacional.
2º- Concorrerá para que se corrija mais facilmente, já a partir de 2005, a situação de incumprimento, que se verifica hoje na maioria dos Estados-membros.
3º- Reduzirá fortemente, na ordem dos milhares de milhões de euros por ano, os custos de implementação dos compromissos assumidos pela Comunidade em Quioto".
Jorge Moreira da Silva considerou que "apesar da bondade da iniciativa e da qualidade da reflexão iniciada, pela qual felicitou a Comissão, o Livro Verde não aprofunda suficientemente alguns aspectos.
1º- O Livro Verde deveria ter fixado os objectivos quantificados de redução de gases com efeito de estufa a serem assegurados pelo comércio de emissões na U.E.;
2º- A produção de energia nuclear é menos danosa para o efeito de estufa do que outras fileiras energéticas (e por isso a implementação deste sistema não a tornará mais cara) mas ela acarreta outros problemas ambientais que não podem ser subestimados. É inaceitável que o Livro Verde tenha evitado realizar uma análise sobre a possibilidade de o sistema de comércio de emissões induzir vantagens competitivas a favor da energia nuclear.
3º- O Livro Verde, no âmbito da selecção dos sectores a integrar o sistema de comércio de emissões na U.E., não se deveria ter limitado a uma abordagem downstream (pelos sectores utilizadores de energia), mas antes deveria ter igualmente confrontado todos os interessados com a abordagem upstream (pelos produtores de energia primária e importadores de energia);
4º- Consideramos imprescindível que no futuro o sistema venha a englobar alguns sectores que o Livro Verde para já excluiu, em especial o dos transportes, que é sector que mais está a comprometer as reduções acordadas, pela U.E., em Quioto .
5º- A Comissão não deveria ter fixado, no debate sobre o âmbito do sistema, o Comércio de Emissões directo entre empresas da U.E. como a única opção possível. Por isso solicitamos à Comissão que proximamente considere todas as alternativas;
6º- Consideramos fundamental envolver os Países Candidatos à Adesão à U.E. no sistema de comércio de emissões tão cedo quanto possível. Nesse sentido, convidamos a Comissão a, numa próxima comunicação sobre o sistema de comércio de emissões, apresentar um plano que preveja a forma de envolver aqueles países;
7º- O método de atribuição das licenças de emissão tem de assegurar o resultado ambiental pretendido, a não distorção da concorrência e ser tão simples quanto possível. Consideramos que o leilão poderá mais facilmente responder a esses requisitos do que o grandfathering. No entanto, este não é o momento para excluir nenhum método, pelo que convidamos a Comissão a continuar esta reflexão alargando-a igualmente a um terceira opção: o benchmarking".
Comunicação da Comissão relativa ao Programa Europeu para as Alterações Climáticas (ECCP):
Para Jorge Moreira da Silva "a Comunicação sobre Políticas e Medidas, que lança as bases para o Programa Europeu para as Alterações Climáticas, é uma decepção".
Moreira da Silva considera que "desta comunicação resulta: uma secundarização do papel das Políticas e Medidas, isto é, da acção política doméstica e comunitária, face aos mecanismos do mercado e um desequilíbrio de tratatamento dos diferentes sectores económicos, dado que os sectores económicos que não foram incluídos no sistema de comércio de emissões (exemplo, Transportes) não foram alvo de uma estratégia de aplicação de Políticas e Medidas suficientemente ambiciosa".
Jorge Moreira da Silva convidou a Comissão a "completar urgentemente o Programa Europeu para as Alterações Climáticas (ECCP) e a apresentar, seis meses após a COP6, um conjunto de propostas específicas tendentes à implementação de Políticas e Medidas no qual se defina, estrategicamente, por sector económico e por cada política ou medida proposta, o grau de importância, o custo de implementação, a contribuição quantificada para o compromisso de redução de GEE, o calendário de implementação, as metas intermédias e os instrumentos de coordenação".
COP6 (6ª Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas), Novembro 2000, Haia:
Para Jorge Moreira da Silva "a agenda política para a COP6 é muito clara:
- os países industrializados devem tomar a liderança nas acções destinadas a travar as alterações climáticas;
- as Políticas e Medidas constituem o instrumento prioritário e os mecanismos flexíveis, baseados nas regras do mercado, não poderão ultrapassar 50% de todos os esforços de redução dos GEE;
- o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (CDM) deverá ser dotado de uma lista positiva de projectos e medidas elegíveis, na qual se excluam as fontes de energia nuclear e fósseis em grande escala;
- o uso de sumidouros (carbon sinks) deve ser fortemente limitado até que seja providenciada suficiente informação científica e criado um sistema de supervisão".
Moreira da Silva defende que "a dificuldade da COP6 não resulta apenas da complexidade dos leftovers de Quioto, mas também da conjuntura política dos U.S.A. e que a União Europeia não deverá abdicar da sua agenda política. Se abdicarmos dela, com o intuito de procurar um acordo com os USA, arriscamo-nos a ter um resultado lose-lose: pioramos a redacção do Protocolo e apesar disso este nunca será ratificado pelos USA".
Para Jorge Moreira da Silva "devem ser enviados ao Japão, ao Canadá, à Rússia e aos Países da Europa Central e de Leste sinais de abertura negocial porque é possível que tenhamos de iniciar a aplicação do Protocolo de Quioto sem os U.S.A."
A terminar, Moreira da Silva considerou que "este é o momento da verdade para o dossier das Alterações Climáticas e que só a liderança da U.E. poderá salvar a COP6 de um fracasso e evitar que as Alterações Climáticas iniciem um período de longo impasse".