Arlindo Cunha defendeu hoje, em Estrasburgo, que "a União Europeia jamais poderá entrar nas negociações da próxima ronda da Organização Mundial do Comércio sem estar escrito 'preto no branco' o princípio da multifuncionalidade, bem como as dimensões sociais, ambientais e territoriais da agricultura europeia"
Para Arlindo Cunha, que usou da palavra no Plenário do Parlamento Europeu, no debate sobre a reunião da OMC em Seattle, "a evolução das negociações em Seattle permitiu evidenciar a abertura política, ainda que muito tímida e insuficiente, a algumas das posições da União Europeia a respeito do dossier agricultura, como é o caso das preocupações ambientais, da segurança dos alimentos ou do desenvolvimento das comunidades rurais, a que haverá que acrescer a invocação do Artigo 20 e do Preâmbulo do Acordo de Marraquexe como quadro de referência negocial do futuro".
Todavia, acrescentou o Deputado social democrata, "a estes aspectos positivos vieram sobrepor-se outros profundamente negativos e contraditórios com as nossas posições. Em primeiro lugar, uma referência obsessiva na proposta de texto de compromisso à 'redução substancial' dos apoios internos à agricultura, sem ter minimamente em conta a diversidade de estruturas produtivas das partes contratantes e uma classificação minimamente objectiva e homogénea dos diferentes tipos de subsídios dados pelos diversos países.
Em segundo lugar, a insistência inflexível em 'eliminar' todos os apoios à exportação. Apesar de tudo foi já um progresso falar de 'todo o tipo de apoios à exportação', e não apenas das restituições pagas pela UE. Desta forma ficariam também incluídas (ao contrário do que actualmente sucede) os créditos bonificados americanos e os subsídios veiculados por empresas públicas que operam em vários países do grupo de Cairns.
Em terceiro lugar, e especialmente, a rejeição do conceito de 'multifuncionalidade' que é o pilar principal do modelo agrícola europeu e a base de sustentação do princípio de especificidade da agricultura".
Arlindo Cunha defendeu que "se não figurar essa referência expressa, isso significa que a agricultura será encarada como uma actividade económica normal, sendo cada vez maiores as pressões dos nossos concorrentes para acabar com os apoios concedidos. Ora, todos sabemos que sem um tratamento especial para a agricultura não será possível assegurar um mínimo de preferência comunitária (protecção na fronteira) nem, consequentemente, a garantia da função produtiva primária da agricultura. E acabando a função produtiva, todas as demais (multi)funções acabam com ela".
Para Arlindo Cunha, "por todas estas razões foi bom não haver qualquer acordo em Seattle. Na verdade o acordo em perspectiva para a agricultura era muito mau, deixando-nos à partida numa posição debilitada para negociar no futuro quando, afinal, estamos em condições mais do que nunca de ter uma postura ofensiva".
A terminar, Arlindo Cunha sublinhou que "a experiência mostrou que os Países em vias de Desenvolvimento (PVD) são decisivos para formar uma maioria capaz de fazer prevalecer uma linha de rumo para as próximas negociações. Penso, por isso, que se afigura prioritário que o Conselho e a Comissão promovam uma iniciativa política destinada a aproximá-los das nossas posições e a expressar-lhes o nosso empenho e propostas de cooperação e reforço de comércio. Assim como penso que seria útil um trabalho conjunto com os Estados Unidos no sentido de serem devidamente qualificados e quantificados os apoios à agricultura concedidos pelas duas partes, a fim de assegurar transparência à aplicação das respectivas políticas agrícolas e facilitar um entendimento futuro".
Para o Deputado português, "a reunião de Seattle comprovou a grande unidade e coesão da União Europeia em torno dos pontos fundamentais aprovados pelo Parlamento Europeu no contexto do relatório Shwaiger. Para isso foi determinante a excelente articulação entre os Comissários Lamy, Fischler e Byrne e a delegação do Parlamento Europeu. Tenho a certeza, acrescentou, que, se continuarmos a trabalhar com este bom entendimento, seremos capazes de defender com eficácia os nossos pontos de vista".